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Ouvidos Moucos

POR RICARDO GONÇALVES STRENGER

ESPAÇO ABERTO

EM 19/08/2009

9 MIN DE LEITURA

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Enfrentamos na cafeicultura um grande período de instabilidade social e econômica, ocasionado por graves dificuldades estruturais, e não tem havido condições subjetivas e objetivas para encontrar soluções. Em situações emergenciais, como as de hoje, as tábuas de salvação a que em primeiro lugar nos agarramos são as menos aptas a produzir os efeitos desejados.

Para entendermos o que ocorre hoje, precisamos voltar ao passado, mais precisamente em 1902, quando os baixos preços levaram o governo a proibir o plantio de café por 5 anos. Durante muitos anos o café foi a mola propulsora da nossa economia, chegando a representar até 80% da pauta de exportações. A intervenção do Estado era muito forte, chegando até mesmo a queimar a impressionante quantidade de 78,21 milhões de sacas de café de 1931 a 1944 e ainda outros 10,0 milhões de 1959 a 1962.

Tivemos até hoje planos e mais planos, marchas e contra-marchas. Recentemente, tivemos retenções, leilões, EGFs, AGFs, Pepros, estoques reguladores remanescentes e ainda vários outros malabarismos econômicos.

A globalização é uma realidade; hoje o Brasil detém apenas 1/3 da produção mundial, e não pode mais fazer política isolada para o mundo. A crise do momento é de natureza emergencial, mas tem raízes estruturais. O Mercado brasileiro vem mudando desde que novas áreas de produção apareceram, mais especificamente áreas de café Robusta da Ásia, o que ocorreu a partir de 1995, quando países do primeiro mundo, entre eles, França e Alemanha, incentivaram a produção, especialmente no Vietnã.

Naturalmente que, tirando o pretenso objetivo social, tinham em mente o abastecimento do mercado, com um produto mais fácil de ser produzido, de menor custo e consequentemente de menor preço. Mas o que interessa é que a produção mundial se desordenou e os preços foram deprimidos.

No passado mais próximo, exatamente meados de 2003, a crise era intensa e preocupava o mundo inteiro, tanto que o Parlamento Europeu ditou uma resolução sobre a crise no mercado internacional do café. São várias as considerações, mas vamos às que achamos mais interessantes: "Considerando as conclusões do Conselho de Assuntos Gerais e Relações Externas de 19 de novembro de 2002, que expressavam uma grande apreensão quanto à situação atual que afeta muitos países em desenvolvimento"- "Considerando que os preços baixaram mais de 50% nos últimos 3 anos"- "Considerando que os preços ao produtor caíram bastante abaixo dos custos de produção"- "Considerando que quatro empresas, sendo a Nestlé, Kraft, Sara Lee e Proctor&Gamble, controlam quase metade das vendas de cafés mundiais, e que suas margens de lucro continuam a aumentar". Após diversas outras considerações: "Convida a UE a incluir na sua pauta, planos destinados a garantir que as políticas nacionais de desenvolvimento dos países afetados têm em conta a necessidade de minimizar as dificuldades causadas pela queda do preço do café, incentivando a melhoria do café grão cru produzido, bem como apoio à transformação do café em grão, visando produtos finais, que possam ser comercializados na UE e em outros mercados".

Ainda, "Convida que os Estados Membros da UE apoiem o Programa de Melhoria da Qualidade do Café da OIC, através da resolução 407", a qual é semelhante à reivindicação da APAC - Associação Paranaense de Cafeicultores -, para que se reedite a Instrução Normativa nº 8 do MAPA, que normatiza a qualidade do grão cru no Brasil.

Voltando ao Parlamento Europeu, este considera que: "os torrefadores e operadores comerciais deverão adotar códigos de conduta, que cumprirão as normas do OIT/ONU relevantes, e a regulamentação nacional em vigor, e que incluirão o compromisso explícito de pagar preços consentâneos com as necessidades sociais e ambientais do setor". Finalmente, "Convida a União Européia a apoiar o comércio justo no setor do café".

Como vimos, estas colocações são históricas e continuam válidas até hoje, sem que ninguém se preocupasse com elas, ou as implementasse. Só conversa.

No âmbito nacional, no mesmo ano de 2003, foi formado um grupo de trabalho (mais um), de número 815/827, formado pelos mesmos representantes de hoje, reunindo todos os setores da cadeia do agronegócio café, inclusive o Dr. Manuel Bertone, os parlamentares: Silas Brasileiro, Carlos Melles e Odair Cunha, o então presidente do CNC, Osvaldo Henrique Paiva Ribeiro e o então presidente da Comissão Nacional de Café da CNA, João Roberto Puliti. Ainda presente, o atual Ministro Interino da Agricultura, Dr. José Gerardo Fontelles. Este grupo, gerou uma carta ao então Ministro da Agricultura que começava assim : "Acreditamos, Senhor Ministro, que este plano poderá nortear as ações futuras para o equacionamento e desenvolvimento harmônico do agronegócio".

Segue a carta, mas o que nos interessa são as diretrizes, as quais endossam as "Propostas Estratégicas para o Café", apresentadas pela APAC no último dia 30 de julho de 2009.
Vamos ao quadro comparativo abaixo:



Estas são algumas das propostas do Grupo de Trabalho, com as quais concordamos, mas com colocações e soluções diferentes. Só conversa. No mesmo ano, mais precisamente em 16 de dezembro de 2003, temos um relatório da tão falada Bancada do Agronegócio sob o título: Propostas de Políticas de Médio e Longo Prazo para Recuperação e Estabilização da Cafeicultura.

Preciso citar alguns itens do tal relatório: "O setor cafeeiro passa atualmente por uma de suas piores crises. O setor padece da ausência de formulações de políticas consistentes para os mercados interno e externo desde a extinção do IBC e o encerramento das cláusulas econômicas do Acordo Internacional do Café. Aliado a isto, a economia mundial sofreu profundas transformações na década de 90, com o processo de globalização dos mercados e o desenvolvimento das tecnologias de informação. No Brasil, o modelo de política anterior caracterizava-se por uma forte intervenção do Estado, cujo objetivo primordial era o ordenamento da oferta". Mais ainda: "neste período, a política do setor ficou praticamente restrita aos financiamentos para os produtores, sem que se contemplasse sua viabilidade econômica pela falta de renda, o que gerou a necessidade de sucessivas prorrogações nos vencimentos, e o desgaste do setor com o Governo, pelo não cumprimento das pactuações assumidas, e a dificuldade de acesso a novos financiamentos, bem como a exaustão do Funcafé".

As palavras da Bancada do Agronegócio Café continuam válidas e imutáveis. Diante destes fatos, os deputados fizeram na época, varias propostas, que vamos comparar com as propostas estratégicas da APAC:



Estas propostas, com as quais concordamos, e ainda outras sugeridas no trabalho da Bancada do Agronegócio Café merecem discussão. Foram colocadas, mas esquecidas, só foi dada a devida importância às emergenciais para solucionar o então endividamento. Só conversa.
Chegamos aos dias de hoje e ficamos estarrecidos com o encaminhamento para solucionar o impasse econômico em que se encontra a cafeicultura brasileira.

O deputado Silas Brasileiro, no dia 7 de agosto de 2009, publicou um Informativo onde diz que houve uma reunião com a presença de várias lideranças da cafeicultura, o Ministro da Agricultura Reinold Stephanes e o Ministro das Comunicações Hélio Costa. Na ocasião, o Ministro da Agricultura fez várias colocações, entre as quais coloca uma estratégia para a retirada de até 10 milhões de sacas de café do mercado. Diz em seu relatório, o senhor Deputado Federal Silas Brasileiro: "Esta deve ser uma medida de fortíssimo impacto no mercado, que deve provocar a valorização do café para os nossos produtores... melhora sobremaneira a capacidade de pagamento das dívidas pelo aumento da geração de renda para os produtores".

As autoridades esquecem que o Brasil hoje, detém apenas 1/3 da produção mundial de café e não tem condições de fazer política cafeeira isolada do mundo. Esquece-se ainda, que não se sabe ao certo qual a quantidade de estoque que está em mãos dos países produtores. Diante deste fato, e nos guiando pelo passado apresentado neste artigo, temos que tomar muito cuidado com políticas intervencionistas do Estado.

Lembremos uma reunião muito importante da OIC (Organização Internacional do Café) de 30 de janeiro de 2004, que gerou uma circular do CNC (Conselho Nacional do Café ), assinado pelo Sr. Manoel Vicente F. Bertone, então Diretor Superintendente do CNC, e pelo Deputado Federal Silas Brasileiro, então Vice-Presidente do CNC, que estavam presentes à reunião realizada em Londres.

Na ocasião foi discutido o tema "Sustentabilidade", trabalho apresentado pela importante personalidade, Sr. Jason Potts, então coordenador para programas de comércio e investimento em iniciativas para sustentabilidade de commodities do Instituto para Desenvolvimento Sustentável. Diz o relatório: "Foi apresentado um estudo sobre a correlação entre os estoques e os níveis de preços pagos aos produtores, o qual se nota a indiscutível e desproporcional pressão que os estoques apresentam sobre os preços. Este estudo anota ainda que o teste de correlação mostra que a conexão entre os estoques e o preço tem a ver com o lugar onde esses estoques são mantidos. No período de livre mercado, a importância dos estoques é crescente. Preços baixos significam a transferência de estoques dos países exportadores para os importadores. Quando há um deficit da produção em relação às necessidades do mercado, os níveis de estoques dos países exportadores se tornam um fator decisivo na formação dos preços. Mas, quando há excesso de produção, o acúmulo de estoques nos países exportadores não influi sobre os preços.

Concluindo, não podemos mais nos ater a atitudes intervencionistas, que só deram certo em circunstâncias emergenciais e em contextos históricos diferentes. Hoje, temos que nos modernizar e acompanhar as mudanças mercadológicas que a globalização nos impõem.
O momento atual exige que tomemos outros caminhos estruturais,muitos dos quais já foram propostos pela APAC.

Não podemos voltar ao passado e formar estoques, cujo destino mais cedo ou mais tarde, será o próprio mercado. Perpetuar estoques é perpetuar preços baixos. Vou repetir e pedir a atenção dos participes do momento, para a conclusão do Sr. Jason Potts: " ... quando há excesso de produção, o acúmulo de estoques nos países exportadores não influi nos preços." Portanto, reflitam e pensem nas nefastas consequências que um erro poderia trazer ao futuro da cafeicultura brasileira.

Precisamos resolver o problema de endividamento. A melhor forma seria a equivalência com produto, com preço de referência justo e prazos exequíveis, sem formar estoques. O sucesso da cafeicultura só será alcançado quando houver autossustentabilidade. Sem meias palavras, se isso não é possível, vamos ao subsídio explícito. Isso não é moderno, não é lógico e assim sendo, temos que encontrar outra solução, que não seja a intervenção do Estado. Os preços do café até 1998, comportaram-se como uma verdadeira "montanha russa" com altos e baixos. Após 1998, só tivemos preços baixos, pois os malabarismos econômicos intervencionistas não surtem mais efeito.

O livro "A Epopéia do Café no Paraná", de Irineu Pozzobon, nos mostra com clareza esta evolução histórica. Temos que estar atentos para aprender com os erros do passado. Propostas estruturais precisam ser debatidas, para serem implementadas. A APAC está trabalhando para regulamentar a Lei de Rotulação, cumprindo assim com um de seus objetivos.

Não podemos mais fazer jogo de cena para a plateia, que num futuro breve ficará exposta ao fracasso. Aproveitamos a invocação do passado neste artigo, para dizer que reivindicações e propostas, como diria minha avó, não podem ser recebidas por "ouvidos moucos".

RICARDO GONÇALVES STRENGER

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ANTONIO AUGUSTO REIS

VARGINHA - MINAS GERAIS

EM 19/08/2009

Dr. Ricardo Strenger,

Quando estamos no meio de um incêndio, a facilidade de perdermos o foco é muito grande. Nossas ações não são coordenadas e a confusão toma conta. Nesses momentos, normalmente é que emergem os grandes líderes.

Meus comentários abaixo estão desestruturados: misturados entre o operacional e o estratégico (cada um deles ficando com o mesmo grau de importância na medida que a crise aumenta)

Quando o Sr. se refere a "Ouvidos moucos" (surdos) - enxergo a insensibilidade até então, do nosso Ministério da Fazenda. A mim parece que não estão preocupados com as nossas reivindicações e propostas e nem das conseqüências advindas desse descaso.

Realmente percebemos que muito pouca coisa é implementada e, muitas vezes, quando implementada, difere daquilo que foi acertado entre as partes .

Medidas tardias, sempre priveligia grupo limitado de produtores mais estruturados. Grande parcela de produtores perdem, já que foi obrigada a comercializar muito abaixo do seu custo de produção o seu produto, por não agüentar esperar mais por melhores preços. Deveria haver medidas compensatórias (subsídios explícitos) para esses produtores.

Para aqueles produtores que a duras penas ainda estão conseguindo virar os seus negócios, a situação já está quase insustentável.

Agora imaginem, para uma boa parcela de produtores, que já está sendo executada judicialmente?

Nesse caso, querendo o governo reduzir o impacto de uma quebradeira generalizada, poderia como sugestão, recomprar essas ações judiciais em andamento, relativo às dívidas contraídas para manutenção de lavouras, corrigidas desde a origem, pela correção monetária.

Numa outra vertente, se o nosso problema é de excesso de produção, alinho com duas medidas básicas, além de outras, que poderiam ser adotadas pelo governo:

 Proibição de financiamentos a nível nacional, para novos plantios/replantio; e

 Erradicação de lavouras de café (como já aconteceu entre 1966 e 1968) em troca de dívidas, com proibição de replantio na mesma área por 5 anos.

Nós os produtores de café, infelizmente temos um ponto extremamente fraco: Não somos unidos. Nem as nossas cooperativas são. Nem o nosso segmento de produção como um todo é. Este a meu ver é um dos principais desafios da cafeicultura. Como diz o ditado popular : Se o boi soubesse a força que tem não teria cerca para barrá-lo.

Na nossa cultura, parece haver prazer em ver a dificuldade do outro e ou até mesmo vê-lo sucumbir, esquecendo que todos estamos no mesmo barco.

É melhor deixar nossa atividade ser estraçalhada do que sustentar uma necessária união.

Por que o mar é tão grande? Porquê teve a humildade de ficar abaixo de todos os rios.

Está faltando humildade entre os elos do nosso setor, para sermos grandes com sustentabilidade.

O momento exige união da nossa classe. Precisamos trilhar caminhos sabendo com clareza onde queremos chegar.

O Sr. Dr. Ricardo, está contribuindo para isso. Parabéns.

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