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Venezuela muito além do petróleo

POR SYLVIA SAES

E BRUNO VARELLA MIRANDA

BRUNO VARELLA MIRANDA

EM 21/08/2007

6 MIN DE LEITURA

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Caso nos perguntassem o que viria a ser um líquido de cor escura, grande potencial em termos de qualidade e produzido pela Venezuela, certamente a primeira resposta seria: o petróleo. Por isso, entre as notícias das últimas semanas, chamou a atenção a presença de técnicos venezuelanos no Paraná, com o objetivo de aprender com a experiência brasileira. Ao invés do interesse por tecnologia em prospecção ou refinamento petrolífero, era o café o motivo desta visita. Conforme veremos aqui, a cafeicultura possui seu espaço na sociedade venezuelana, e se dificilmente conseguirá rivalizar com o petróleo no curto prazo, por outro lado é um setor com considerável potencial de expansão.

Nos últimos anos, a Venezuela vem ocupando um espaço cada vez maior nos noticiários brasileiros. Nosso vizinho, tradicionalmente conhecido como um importante produtor de petróleo, tem na figura de seu presidente um ponto de exposição constante. Não discutiremos aqui as decisões políticas de Hugo Chavez, bastante controversas por sinal, mas o fato é que desde sua ascensão é crescente a atenção dispensada aos eventos ocorridos em território venezuelano. Se esta emergência é motivada pela posse de consideráveis reservas petrolíferas, isso é assunto para outro momento.

Como país, a Venezuela se caracterizou pela estabilidade política ao longo de boa parte do século XX, em uma época em que outros países da região, o Brasil inclusive, se encontravam em meio ao domínio de ditaduras militares. Curiosamente, o estabelecimento de regimes democráticos ao longo da América do Sul foi acompanhado das turbulências na política venezuelana, sendo o acirramento das posições a face mais visível deste movimento. No entanto, a instabilidade dos últimos anos não esconde o fato de que a Venezuela sempre se caracterizou pela existência de uma classe média consolidada, e que se nos últimos anos se encontra em meio a diversos problemas, é ainda relativamente maior que a da maioria dos Estados latino-americanos.

O café foi introduzido na Venezuela em meados do século XVIII, sendo as primeiras mudas levadas por missionários espanhóis que as obtiveram no Brasil. Rapidamente seu cultivo foi iniciado em diversas regiões do país, e não mais de um século foi necessário para o estabelecimento da produção em larga escala no país. Como principal conseqüência deste processo, por volta de 1830 o café já era o principal produto de exportação da Venezuela, ultrapassando o cacau. Entre os séculos XIX e XX, os venezuelanos chegaram a ser os vice-campeões na produção cafeeira, atrás apenas do Brasil. Nossos vizinhos ficaram conhecidos principalmente pela produção de cafés suaves, segmento dominado pelos mesmos nos tempos áureos da cafeicultura venezuelana.

Mais rápida que a ascensão da cafeicultura na Venezuela foi sua queda, sentida em apenas algumas décadas. A dependência do mercado norte-americano, somada ao aumento progressivo da produção brasileira e a decisão governamental de não desvalorizar a moeda local, tiveram impactos profundos sobre a cafeicultura quando da ocorrência da crise de 29. O encolhimento do setor na Venezuela foi ainda estimulado pela inadequação das políticas governamentais levadas a cabo nas décadas seguintes. Com isso, a cafeicultura do país no final da década de 80 pouco lembrava a vitalidade do início do século.

Mais adiante, a desregulamentação do mercado internacional de café, se por um lado trouxe novas oportunidades para os cafeicultores venezuelanos, igualmente expôs todas as deficiências acumuladas pelos mesmos ao longo de anos de descuido institucional. A baixa produtividade e a pobreza relativa das regiões produtoras contrastava com o grande potencial que as mesmas possuíam para a produção de cafés especiais. Apesar de algumas tentativas de revigorar o setor, a década de 90 pouco trouxe de positivo neste campo. A produção atual, superior às 800 mil sacas, guarda ainda espaço considerável para o crescimento.

Na atualidade, há intenções de fortalecimento da cafeicultura no país, ainda que as mesmas não sejam ainda claras. Entre as metas do governo venezuelano, se encontra o aumento da produção de café, algo que já vem ocorrendo. Desde a política de renovação dos cafezais do país, iniciada há cerca de 10 anos, alguma mudança já vem se materializando, porém é cedo para avaliarmos o potencial de inserção da Venezuela no mercado internacional de café. Ao menos é clara a atenção dada pelo Estado ao setor, refletido em investimentos nos últimos anos.

De maneira geral, a produção de café venezuelano se destina ao mercado local, detentor de estatísticas favoráveis no que se refere ao consumo interno. Apesar de não se igualar aos dados de um país consumidor típico, a demanda por café na Venezuela é superior à da maioria dos Estados produtores. Isso se deve também aos programas sociais do governo chavista, que beneficiam o consumo de café no país, uma vez que incluem o mesmo em um programa de comercialização de produtos alimentícios aos cidadãos com baixa renda.

É importante frisarmos que nem só a investimentos e políticas voltadas a promover o consumo se resume a presença do governo venezuelano no setor cafeeiro. Como em outras áreas da economia, o forte controle estatal tem gerado uma série de reflexos negativos sobre a atividade no país, impedindo o desenvolvimento de potencialidades da cafeicultura venezuelana. Citaremos dois casos desse comportamento como forma de ilustrar bem o quadro.

Primeiramente, há controles por parte do poder estatal em relação à exportação do café venezuelano, já que a prioridade na visão do governo é garantir o abastecimento do mercado interno. Tal visão não é compartilhada pelos cafeicultores do país, principalmente tendo em vista as inúmeras possibilidades que se abrem a partir do estabelecimento de um mercado de exportação. Ainda que a promessa estatal seja a de garantir um preço estável para os cafeicultores, o mesmo é baixo se comparado com o que poderia ser obtido no mercado internacional.

Na atualidade, a existência de algum superávit na produção local tem permitido a venda de café ao exterior, porém esta prática se encontra longe da consolidação, uma vez que a mesma só é permitida quando é entendido por parte do governo que o mercado local se encontra devidamente suprido. Historicamente, os EUA são os principais compradores de café venezuelano, uma tendência que ainda hoje se mantém ativa. As discordâncias em matéria política não foram capazes de impedir que os norte-americanos sejam os responsáveis por cerca de 80% das aquisições de café venezuelano. O restante se divide entre compradores europeus.

Além disso, os controles de preço são uma constante desde 2003, causando uma série de distorções no mercado de produtos agrícolas. No caso do café, tal política não apenas desestimula a produção em determinados contextos, como também abre espaço para o contrabando de café na fronteira com a Colômbia. Cafeicultores venezuelanos, ao compararem os preços praticados no mercado local e no vizinho, acabam optando por operações arriscadas, com o objetivo de obter maiores ganhos. Inclusive, a política de preços foi capaz de inverter uma tendência histórica, qual seja, a de movimento de bens entre as fronteiras dos dois países.

Se por um lado os investimentos dos últimos anos têm possibilitado o revigoramento da cafeicultura venezuelana, a presença estatal é também responsável por ações nocivas ao pleno desenvolvimento do setor no atual contexto internacional. Principalmente por se tratar de um país com boas possibilidades de produção de cafés de qualidade superior, seria fundamental a busca de uma inserção privilegiada nos mercados internacionais, a exemplo daquilo que faz sua vizinha cafeicultora mais famosa, a Colômbia. Afinal, estamos falando de um país concentrado na produção de café Arábica de boa qualidade, algo que será cada vez mais valorizado nas próximas décadas.

SYLVIA SAES

Professora do Departamento de Administração da USP e coordenadora do Center for Organization Studies (CORS)

BRUNO VARELLA MIRANDA

Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri

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