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Luiz Hafers: "nós temos que copiar o vinho"

GIRO DE NOTÍCIAS

EM 20/07/2009

9 MIN DE LEITURA

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Luiz Marcos Suplicy Hafers nasceu em Santos/SP, em 1935. Trabalhou como corretor e exportador de algodão na empresa da família entre as décadas de 50 e 70. Iniciou a vida de produtor rural em terras arrendadas em 1958. Comprou sua primeira fazenda de café no norte do Paraná em 1962. Sempre atuante, Hafers também participou de grandes reflorestamentos na década de 1970 e presidiu a Sociedade Rural Brasileira de 1996 a 2002. Fã ardoroso do romancista Guimarães Rosa, o produtor comprou em Minas Gerais uma propriedade citada no livro Grande Sertão: Veredas. "Minha fazenda ficava onde Riobaldo encontra o diabo. Olha só que referência boa", conta em tom de graça.

Hafers é também um apaixonado pela cafeicultura. Tanto que, apesar da crise que persiste na atividade há mais de uma década, ele mantém íntegra a vertente de cafeicultor. Ex-dono de uma fazenda com 600 hectares de terras, Hafers reduziu sua área para modestos 150 hectares, divididos em duas propriedades : uma na Bahia, outra no Paraná. "Já vendi terras por necessidade, hoje vendo por opinião. Acho melhor reduzir a área e aumentar a produtividade que manter os cafezais abandonados, sem os devidos tratos culturais", disse em entrevista concedida à Revista Globo Rural em meados de junho, quando revelou suas insatisfações com a atual condução das políticas para o setor, mas reforçou sua convicção na importância do desenvolvimento da cafeicultura nacional.





Globo Rural - Como o senhor vê a crise internacional?

Luiz Hafers - A minha suspeita é que esta crise na verdade é um grande esgotamento de soluções propostas. A crise financeira americana aconteceu porque desmontaram regras antigas e não se colocou nada no lugar. Os americanos foram absolutamente irresponsáveis na condução da política financeira. O dólar é uma moeda falsa há muito tempo, porém uma moeda conveniente nas trocas de todo o mundo.

GR - O que o senhor quer dizer com moeda falsa?

Hafers - Eu conto rapidamente o que aconteceu em 1953 no Paraná. Seria uma grande produção de café, mas a safra foi frustrada e encrencou todo mundo que trabalhava com o grão. Um sujeito me pedia desesperado que eu o pagasse, mas eu não tinha dinheiro. Então dava um crédito visado. Ele passava esse cheque para frente como pagamento de outras contas. Com isso, todo mundo pagou todo mundo. Veio a safra de 1954 e as contas estavam pagas, mas o que houve foi uma emissão de dinheiro falso. Nos Estados Unidos não vai ter safra de café e eles estão vivendo muito acima das capacidades, inclusive de dívida. Essa coisa foi sendo empurrada e as regras clássicas de precificação, oferta, demanda e estoque foram rompidas. E os produtores de commodities são os que mais sofrem com essa situação.

GR - 0 senhor pode dar um exemplo?

Hafers - O café hoje no Brasil é um exemplo clássico. A estatística é boa, mas os preços estão horríveis. Eu explico: o Brasil é produtor e consumidor de café com poderes mais ou menos equilibrados, mas no mercado internacional são milhares de produtores de café e quatro consumidores cartelizados. É evidente que o poder é diferente. E os grandes fundos de investimento ainda entraram no mercado comprando e vendendo independentemente de safra. Com isso, o preço de café tem se comportado simetricamente com a diferença de produção líquida dos grandes fundos. Isso acontece há mais de cinco anos e significa dizer que os preços sobem 20 centavos quando os fundos compram 20 mil contratos. Se eles vendem 15 mil contratos, os preços caem 15 centavos. Não podemos ficar à mercê disso.

GR - E que opção tem o cafeicultor?

Hafers - Ele está num impasse. Eu, como produtor, me encontro nesse ponto. Eu tinha 600 hectares com lavouras de café e perdi uma fortuna porque achei que ia haver uma recuperação de preços. Isso aconteceu nos últimos seis anos. Recentemente, meu genro, que cuida das minhas propriedades, voltou da fazenda dizendo que temos de cortar dois terços da nossa área atual. Sabe, eu fui um grande vendedor de algodão e assisti ao desaparecimento da indústria têxtil na Europa por causa da mão de obra. A indústria saiu da Europa e migrou para o Japão, para Taiwan e para Hong Kong, com máquinas modernas, e os outros países caíram em decadência porque não tinham capital para se modernizar. Com esse exemplo eu levanto uma questão: o Brasil não pode ter negócios que dependam de mão de obra barata, porque dessa maneira teremos uma crise social, mas, por outro lado, se tivermos mão de obra cara, vamos ter uma crise econômica.

GR - Existe alguma alternativa para esse impasse?

Hafers - Nós temos de copiar o vinho. Até pouco tempo atrás, tomávamos café por hábito, ainda que ruim fosse. O segredo do café não é esse. É um café que lhe dê prazer. O que é útil tem preço, mas o que dá prazer tem valor. Outra coisa. Trabalhamos em três áreas, o pequeno, o médio - em que eu me encaixo - e o grande. O médio está em péssimas condições, porque não tem nem o custo nem a escala. O meu vizinho tem quatro hectares e uma capacidade menor que a minha, mas o filho colhe, a mulher trata, e com isso ele tem um custo de oportunidade que, ou ele faz isso, ou ele vai ser boia-fria. O grande produtor tem advogados para resolver as questões trabalhistas, ambientais e de mercado. O médio está espremido. Eu acho que somente vão sobrar no mercado o pequeno e o grande produtor.

GR - Como a crise está afetando esses três setores hoje?

Hafers - O pequeno pouco, porque ele não tem custo e existem as linhas do Pronaf - Programa Nacional de Agricultura Familiar. O grande também sofre pouco porque ele é capitalizado. Os médios, que somam 70% da cafeicultura nacional, são os mais prejudicados. Eu acho que nossa liderança poderia ajudá-los, mas ela é obsoleta. Defendo a tese de que precisamos de uma ruptura, não de uma condução. As nossas lideranças atuais respondem à aflição passada, e não à oportunidade futura. Eu acho que o médio produtor vai desaparecer, mas não é nosso interesse acelerar o seu desaparecimento.

GR - Há quanto tempo essa situação é vigente?

Hafers - Há dez anos que os custos crescem mais depressa que os preços pagos ao produtor. Para se ter uma ideia, quando o café valia 50 dólares a saca - o que achávamos uma catástrofe -, o salário mínimo valia 60 dólares. Hoje, o salário mínimo ultrapassou os 200 dólares e o café vale 100 dólares. Atualmente, 70% dos custos da lavoura se referem à mão de obra e insumos, e esses custos subiram de maneira acelerada, mas o preço do café não. Fomos tapeando isso, primeiro com aumento de produtividade, que dobrou em 10 anos, mas um dos problemas da produtividade e que ela precisa de capital, que não tínhamos. Portanto, criamos dívida. Trata-se de uma equação bastante complicada.

GR - Conto está o mercado de café neste momento?

Hafers - Hoje, a saca de café é negociada a 250 reais e o custo de produção é extremamente discutível. Este ano a safra é pequena e o custo de produção será mais alto. Uma outra coisa que aconteceu é que mudou o perfil do colhedor. Os meus colhedores colhiam, em média, quase cinco alqueires por dia, hoje não chegam a 4 alqueires, e qualquer sujeito medianamente disposto ganha mais fazendo qualquer outra coisa. Se você for a minha fazenda verá que quando o ônibus para, só desce mulher e idoso, porque o que nós pagamos não atrai outras pessoas. Estamos caminhando para um impasse terrível e a liderança dessas massas está muito mais preocupada com a sobrevivência das cooperativas que com os produtores.

GR - Sua visão parece ser bem pessimista. Existem soluções?

Hafers - Olha, o único café que funciona é o conilon. O arábica está destroçado. O que acontece com o conilon e que nós, arrogantemente, dizíamos que ele não era café. O mundo toma 30% de conilon, e o Brasil 50%. Esse café é melhor que o arábica ruim e produz o dobro com o mesmo investimento, o que o torna muito mais competitivo. O estado do Espírito Santo há dez anos produzia 2 milhões de sacas de arábica e 2 milhões de conilon. Hoje continua produzindo 2 milhões de sacas de arábica e 8 milhões de conilon. Eu já fui contra o marketing. Hoje sou a favor. O café colombiano é comercializado 100 dólares acima do café brasileiro e não vale isso. Isso acontece porque eles conseguem vender por opinião e nós estamos vendendo por precisão. A grande razão do nosso péssimo preço é a necessidade financeira.

GR - A Organização Internacional do Café estima queda na produção mundial. Como os preços não reagem a esse indicador?

Hafers - Primeiro por conta da nossa enorme pobreza financeira. Nós não vendemos por opinião, vendemos por necessidade. O café da Colômbia é muito mais valorizado que o nosso e isso acontece porque todo mundo sabe que eu tenho de vender. No momento não há razão nenhuma para que o mercado mude de atitude. Tanto assim que, quando os fundos de investimentos compram, eles puxam o mercado. Faz dez anos que não há registro de geadas ou de seca forte. Fatores como estes sustentariam uma alta do mercado.

GR - E como é a situação do Hafers cafeicultor neste contexto?

Hafers - Eu já vendi três fazendas por necessidade, mas acho que vou vender mais uma. Desta vez, por opinião. Atualmente tenho 150 hectares, mas no ano que vem minha área deve se situar em cerca de 60 ha. Eu reduzi área, mas a maioria dos cafeicultores do meu porte abandonou as lavouras. Eles simplesmente não as tratam. A realidade é que hoje os sitiantes que estão bem não tem o café como principal produto. No Paraná, como a terra é boa, há opção, mas, em Minas Gerais, por exemplo, não há muita saída.

GR - A produção de cafés gourmets não favorece a atividade?

Hafers - A llly instituiu a ideia de se tomar um bom café. A Starbucks vende uma xícara de café por 4 dólares. Se a empresa pagou 500 reais por saca - o que é um preço alto -, ele tem um custo de 5 centavos por xícara. Quem ganha dinheiro é quem vende, e não quem produz. A tendência do café brasileiro é ficar no custo de subsistência ou numa grande companhia, que é toda mecanizada. Mas eu acho que devemos atrasar a quebra do produtor médio para dar tempo para ele mudar para outras atividades.

GR - 0 senhor acha que movimentos como a Marcha em Brasília auxiliam na resolução desse tipo de problema?

Hafers - Eu não acredito na política conflitiva nem radical. O pessoal gosta muito da bravata e eu acho que a radicalização só faz valorizar o radical do outro lado e os dois sobrevivem do conflito. Outro problema é que a lavoura, em geral, não consegue mais se comunicar com a opinião pública. A opinião pública se omite ou se aborrece com os problemas da agricultura. Eu tenho interesse na solução, não na razão; no todo, e não no particular. Tenho interesse na minha convicção, e não na minha conveniência. Por isso estou fora de moda.

As informações são da revista Globo Rural, adaptadas pelo CaféPoint.

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JOÃO CARLOS REMEDIO

SÃO JOSÉ DOS CAMPOS - SÃO PAULO - PRODUÇÃO DE CAFÉ

EM 21/07/2009

Que entrevista! A situação da cafeicultura nacional foi dissecada por alguém de credibilidade, experiência e desânimo em relação à cafeicultura. É muito difícil para nossas autoridades tentarem ajudar a cafeicultura de uma fora mais consistente? Esta crise econômica na cafeicultura poderá se transformar em uma grande crise social, com grande numero de desempregados no campo. Não seria bom para ninguém.

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