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Já não era sem tempo

POR BRUNO VARELLA MIRANDA

E SYLVIA SAES

BRUNO VARELLA MIRANDA

EM 29/05/2008

5 MIN DE LEITURA

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Poços de Caldas foi palco de um evento que há muito se fazia necessário para a cafeicultura brasileira. Afinal, a organização do I Simpósio de Certificação de Cafés Sustentáveis trouxe para o centro das atenções um tema muito discutido e geralmente pouco compreendido. Em um setor no qual debater o nível de preços é rotina, muitas vezes faltam discussões acerca dos caminhos para a valorização da cafeicultura. Comparar iniciativas, esclarecer dúvidas, ter contato com iniciativas de sucesso: durante três dias, foram diversos os atrativos para as pessoas que se deslocaram até esta cidade mineira.

A emergência desta miríade de padrões e regulamentações nos últimos anos traz certa confusão em um primeiro momento, mas não escondem o fato de que, progressivamente, determinados consensos estão emergindo. De fato, alguns padrões foram observados na fala de todos os palestrantes, independentemente da orientação social ou ambiental adotada pelo selo representado. É justamente em torno destas regularidades que este artigo rondará. Nesse sentido, três tópicos serão abordados: o consumidor, a profissionalização e a qualidade.

Primeiramente, o papel do consumidor foi salientado em cada momento do Simpósio. Afinal, é por causa deles que a certificação surge e ganha força, e são suas vontades as bússolas que deveriam ser usadas por cafeicultores ao redor do mundo. Um selo somente se sustenta quando apoiado na demanda de alguém disposto a pagar por um atributo, por mais abstrato que seja. Por isso, seria inocência achar que a confecção de padrões acompanha alguma lei da natureza, ou que é possível a consolidação de um critério integralmente objetivo por parte de uma certificadora.

Inclusive, do título do Simpósio pode ser tirado um exemplo que bem demonstra este quadro. Sustentabilidade é uma noção ainda aberta, cujo significado varia de acordo com os pressupostos teóricos e objetivos em mente, de modo que as iniciativas neste campo carregam consigo uma alta dose de subjetividade. Daí a centralidade do consumidor nessa história toda; uma vez que a proteção ao meio ambiente não é gratuita, alguém tem que pagar a conta. E aqui vale mais uma vez a velha lógica da razão incontestável do freguês.

A segunda regularidade observada entre as iniciativas de certificação é a possibilidade de profissionalização dos cafeicultores. A contrapartida proporcionada pela certificação não é apreciada apenas por consumidores endinheirados, mas pelo setor como um todo. Produtores detentores de um selo são estimulados, quando não obrigados, a trilharem a rota das boas práticas administrativas, combatendo desperdícios e investindo em melhorias para a propriedade cujos reflexos são sentidos nos preços negociados. Muito se fala acerca dos gastos decorrentes da adoção de um padrão, mas são poucos os que se lembram dos ganhos obtidos quando da implementação bem sucedida de programas sérios no interior da propriedade.

Isso sem falar no fato de que a adesão a um programa de certificação em geral denota um quadro muito mais amplo. O cafeicultor atento à certificação geralmente está nas principais novidades no setor, e daí tira seu fôlego extra. Assim, sua preocupação não se limita à demanda, sendo o olhar crítico voltado também para o interior da propriedade. Um selo por si só pouco poderia fazer pelo setor como um todo, caso não houvesse a preocupação com o sentido do padrão. E é aí que entra um conjunto de ações, visando garantir maior eficiência interna e maior atenção ao mundo externo. Daqui tiramos o gancho para o terceiro consenso observado nos debates do Simpósio.

Qualidade segue sendo uma variável chave para a inserção da produção, mesmo em nichos como aqueles proporcionados pela certificação. Obter um selo é apenas o primeiro passo de um longo caminho, e quem paga exige; por isso, qualquer que seja o padrão adotado, é fundamental ter em mente que o que abre realmente as portas é a qualidade da bebida. Mesmo em segmentos como o orgânico e o Fairtrade, nos quais é esperada uma carga ideológica mais acentuada por parte dos compradores, não há negócio sem um retorno tangível, qual seja, satisfação no ato do consumo. Não nos esqueçamos de que, por trás de todas as iniciativas existentes, predomina uma meta comum de garantir a forma mais apropriada de produção para a cafeicultura, o que traz a questão da qualidade praticamente automaticamente para a discussão.

Antes das conclusões, é importante que seja salientado um ponto importante, e que talvez não tenha sido exposto ao longo deste texto: em um mundo no qual o conjunto dos cafeicultores possui o mesmo selo, não há espaço para um diferencial de preço baseado no atributo medido. Conforme pretendemos mostrar no futuro, certificar todo o mercado erodiria os ganhos dos pioneiros, a menos que estes encontrassem novas formas de diferenciação. Além disso, mercado de café commodity sempre existirá, ainda que seu humor oscile eternamente. Finalmente, o movimento da certificação é bastante dinâmico; determinados padrões deixarão de constituir um diferencial no futuro, alguns deles consolidados em todo o setor, outros abandonados.

Tendo em vista este quadro...

Como este artigo tentou demonstrar de forma preliminar, há uma série de pontos de contato entre os principais selos existentes no mercado. Inclusive, algumas destas iniciativas se sobrepõem, havendo alguma concorrência entre programas. Por outro lado, os cafeicultores se deparam com uma realidade na qual a adesão a algum destes selos se revela custosa, e isso quando não é exigida a múltipla certificação. Assim, o Simpósio deixa no ar, além de diversas afirmações, um questionamento bem direto: são necessários tantos programas de certificação, ainda que compartilhem diversos princípios?

Evidentemente, uma certificação única seria inviável, dadas as diferenças entre a produção convencional e orgânica, por exemplo. No entanto, um enxugamento poderia render seus frutos, do ponto de vista dos produtores. Cafeicultores economizariam, alguns requisitos básicos poderiam ser garantidos e um número crescente de consumidores se conscientizaria, devido à união de esforços traduzida em ações de marketing e a simplificação das regras. Entre os agentes envolvidos no mundo do café, pode parecer trivial a existência de diversos selos, porém é vital a lembrança de que o mundo não gira em torno da cafeicultura, e de que os supermercados estão repletos de produtos, cada qual com seu chamariz e suas especificidades. Tornar as regras mais claras para aqueles que têm sempre razão somente pode contribuir para o crescimento de um segmento com maior valor agregado.

BRUNO VARELLA MIRANDA

Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri

SYLVIA SAES

Professora do Departamento de Administração da USP e coordenadora do Center for Organization Studies (CORS)

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CARLOS ANTONIO FERREIRA

SÃO PAULO - SÃO PAULO - PRODUÇÃO DE CAFÉ

EM 29/05/2008

Prezados Bruno e Maria Sylvia,

Excelente a abordagem sobre o tema, que julgo ser divisor de águas da cultura cafeeira do século XIX. Ao longo do século XX a cafeicultura prosseguiu apenas substituindo mão de obra escrava por remunerada, e que nos últimos anos do século passado e já nesta primeira década do século XXI, rompe definitivamente o modelo de negócios anterior.

Ainda há muito por fazer, mas exemplos de sucesso já deixam claro que não estamos especulando o futuro, mas construindo o presente.

Concordo plenamente com vocês quando colocaram em primeiro lugar a opção do Cliente por produtos certificadamente diferenciados. Essa consciência de mercado vem crescendo de forma surpreendente e é o grande agente de transformação. O poder passa da mão dos que detém capital e força e é naturalmente transferido a quem compra. E o que mais me encanta nessa revolução natural e silenciosa é que os benefícios são para todos:

- Clientes consumindo produtos melhores em todos os sentidos - qualidade e impacto sócio-ambiental;
- Produtores são beneficiados com melhores margens e modelo de negócios muito mais robusto do que flutuar à mercê das variações da commodity;
- Trabalhadores recebem mais formação, educação, condições de trabalho e salários; e
- O impacto ambiental é minimizado - a harmonia com o meio ambiente retorna em forma de longevidade da cultura e preservação para as próximas gerações.

E por tantos benefícios em uma cadeia produtiva por completo, o sobrepreço do produto certificado já não é considerado abusivo pelo atual mercado consumidor.

Com o tempo, as práticas hoje consideradas pioneiras serão padrão de mercado. Com isso, o ajuste natural dos preços irá acontecer por conta de volume e os produtos certificados terão abrangência popular.

E, com certeza, nessa ocasião, os empreendedores do século XXI já terão novidades para agregar novos valores aos seus produtos.

Assim aconteceu com o vinho, os queijos, os cortes nobres de carne, as frutas especiais e não há porquê não acontecer com o café, para os que decidirem e souberem trabalhar o modelo de boutique agrícola, sucesso antigo na França, Itália, Suiça e Espanha, entre tantos outros países.

Parabéns também pelo fechamento não conclusivo sobre as diversas certificações. Compartilho completamente da mesma visão e acredito que aí se encontre uma das mais perversas armadilhas, tanto para os produtores como para os processos de certificação.

E é pelo mesmo ponto de vista deste artigo que eu acredito que também venha a resposta à pergunta tema de outro artigo escrito por vocês, "Sustentabilidade para quem?": para o mercado, produtores e trabalhadores do setor cafeeiro. Este será o caminho viável para o século XXI.

Um forte abraço,

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