ESQUECI MINHA SENHA CONTINUAR COM O FACEBOOK SOU UM NOVO USUÁRIO
FAÇA SEU LOGIN E ACESSE CONTEÚDOS EXCLUSIVOS

Acesso a matérias, novidades por newsletter, interação com as notícias e muito mais.

ENTRAR SOU UM NOVO USUÁRIO
Buscar

Fortalecimento do mercado = acirramento da competição

POR SYLVIA SAES

E BRUNO VARELLA MIRANDA

BRUNO VARELLA MIRANDA

EM 09/10/2007

6 MIN DE LEITURA

0
0
Engana-se quem pensa que a produção de commodities perdeu sua importância política após o fim da Guerra Fria. Impulsionadas pelo contexto da competição entre EUA e URSS pela influência sobre os países em desenvolvimento, as políticas internacionais delineadas ao longo do século XX visavam a garantia da estabilidade em regimes alinhados ao bloco capitalista. Na atualidade são as crescentes preocupações com a questão ambiental e com o combate à pobreza que movem a retórica e os trabalhos na arena internacional. É em um ambiente de crescente inquietação que os norte-americanos voltam à ativa em organizações como a Organização Internacional do Café (OIC).

Ao deixarem a OIC no início da década de 90, os Estados Unidos deram um claro recado de que não mais sustentariam uma política internacional para o café como aquela observada ao longo das décadas anteriores. Nos anos seguintes, foi notável a tentativa de alguns dos países produtores de redesenharem um quadro semelhante ao do auge dos Acordos Internacionais do Café, porém a ausência de um ambiente político favorável sepultou definitivamente qualquer possibilidade de um acordo baseado no controle deliberado de preços. Da parte dos EUA, fundamentais para a viabilidade de qualquer acordo de longo alcance na esfera internacional, a mensagem era clara: as forças do mercado deveriam ser deixadas à vontade.

A fim de termos plena noção da lógica por trás da organização do comércio internacional de café, é fundamental lembrarmos que este produto é produzido exclusivamente em países em desenvolvimento, tendo seu processamento e consumo concentrado principalmente naqueles Estados com maior renda per capita. Se por um lado é inexistente a atuação de lobbies de produtores nos Congressos dos países desenvolvidos, por outro há consideráveis interesses envolvidos quando o assunto passa pelo suprimento de matéria prima às empresas dedicadas ao processamento de café. Com isso, é natural a guinada na orientação norte-americana frente ao café pós-queda do Muro de Berlim.

A euforia vivida em parcela considerável da comunidade internacional, cujo principal reflexo se deu em uma busca crescente pela via multilateral não teve sua contrapartida no campo do café, cuja coordenação interestatal até então vinha se dando de forma inversa à tendência predominante na década de 90. Se comparamos com as iniciativas levadas adiante na Organização Mundial do Comércio, por exemplo, a orientação da OIC parecia absolutamente deslocada do contexto, o que contribuiu para seu esvaziamento (leia-se retirada dos EUA).

O que se viu nos anos seguintes à retirada dos norte-americanos da OIC é bem conhecido de todos. Crises na cafeicultura derrubaram as cotações internacionais, trazendo dificuldades para um grande número de produtores. Esta situação levou à criação da APPC (Associação dos Países Produtores de Café), em 1993. Agindo unilateralmente, sem o compromisso dos consumidores em regular a oferta e tendo como ofertantes um número significativo de produtores, o cartel da APPC não se sustentou. No final da década de 1990 as tentativas de elevar os preços por meio de restrição da oferta fracassaram, mostraram que o Brasil não é mais o grande líder, como no passado em que detinha 60% das exportações mundiais. Isso em um ambiente no qual o ganho das empresas com o comércio de café junto aos consumidores era crescente, em um quadro considerado por alguns autores especializados na área como o "paradoxo do café". Muita riqueza vinha sendo gerada na cadeia como um todo, porém os resultados eram desigualmente distribuídos. Fazendo um paralelo com o quadro global no campo comercial, os resultados colhidos pelos países em desenvolvimento na OMC tampouco podem ser comemorados, uma vez que as promessas de liberalização dos mercados do Primeiro Mundo figuram mais como promessas sem data para a concretização.

A primeira década do século XXI traz consigo esta crescente inquietação derivada dos parcos resultados colhidos na esfera internacional pelos países em desenvolvimento, somada ao temor global crescente por uma crise ambiental sem precedentes. De fato, já não é mais tão forte a noção de que a liberalização dos mercados trará benefícios no curto prazo a todos os envolvidos neste processo, daí o maior esforço da diplomacia dos EUA em fortalecer este discurso. A presença mais ativa dos norte-americanos em áreas até então negligenciadas, como as negociações acerca das mudanças climáticas ou o comércio do café, nada mais é que a tentativa de fazer valer os interesses deste país na esfera internacional.

Quando tratamos da influência norte-americana na concepção das linhas que deverão nortear a cafeicultura internacional nos próximos anos, leia-se o fortalecimento do livre comércio. De maneira geral, o novo Acordo Internacional do Café, concluído no final de setembro, busca reforçar o papel dos mercados na obtenção de maiores ganhos a todos os agentes envolvidos na cadeia, com especial atenção aos produtores. Tal direcionamento é perfeitamente alinhado aos interesses norte-americanos, cuja ênfase no fortalecimento dos mercados e no incremento do comércio internacional é notável no discurso oficial. Ainda mais por estarmos falando aqui de um produto no qual o interesse dos EUA se resume ao provimento de matéria prima barata e de qualidade, tal direcionamento de política predominará.

Afinado com esta idéia, o novo acordo busca um maior intercâmbio de dados e informações relativas ao mercado internacional, bem como a consolidação de instrumentos de crédito e financiamento dos produtores. Adequar definitivamente os produtores a um novo quadro, no qual a busca por novos horizontes repousa na iniciativa individual ao invés da proteção estatal, parece ser a meta aqui. A roupagem ambiental do novo acordo é dada por meio da citação ao papel dos cafés sustentáveis na obtenção das metas de preservação condizentes com o desafio das próximas décadas. Tudo seguindo a idéia de que mais mercado é o melhor remédio para os principais desafios da atualidade.

No texto do acordo, divulgado na página da OIC, são recorrentes as citações à necessidade de garantir a satisfação não só de produtores, como de consumidores também. Definitivamente, o regime dedicado a controlar cotações internacionais dá lugar a um órgão dedicado a promover o consumo de café e o maior cuidado dos produtores com a produção. No lugar de referências a estoques estratégicos, cita-se a importância do respeito a regras sanitárias ou práticas ambientais. Isso se deve também ao fato de que, entre seus mais de setenta membros, a OIC possuir um grande número de países consumidores, estes interessados em obter a maior qualidade possível, de preferência ao menor custo.

Nos próximos anos, veremos com maior claridade o que significa o retorno dos EUA aos debates na OIC. Desde 2005 na ativa, os norte-americanos já influenciaram de forma determinante os rumos do atual acordo, válido para os próximos dez anos. Caberá agora esperar para ver até que ponto o mesmo contribuirá para o aprofundamento daquilo que prega. Principalmente no que se refere ao campo da sustentabilidade, ainda é enorme o espaço para controvérsias, de modo que os esforços levados a cabo nos primeiros anos deste século não podem ser encarados de forma alguma como passos definitivos para a superação dos atuais dilemas enfrentados pela humanidade.

O fundamental a observarmos aqui é que o aprofundamento da concorrência nos próximos anos pinta como principal tendência. Da mesma forma, alguns nichos afinados com o discurso da preservação ambiental podem se dar bem, ainda que a situação precária da maioria dos cafeicultores envolvidos nestas áreas e a pequena escala de produção por propriedade sejam consideráveis. Falar de comércio internacional, por mais econômico que soe em um primeiro momento, é ainda necessariamente um exercício de retórica política e amplo embate nas mesas de negociações.

SYLVIA SAES

Professora do Departamento de Administração da USP e coordenadora do Center for Organization Studies (CORS)

BRUNO VARELLA MIRANDA

Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri

0

DEIXE SUA OPINIÃO SOBRE ESSE ARTIGO! SEGUIR COMENTÁRIOS

5000 caracteres restantes
ANEXAR IMAGEM
ANEXAR IMAGEM

Selecione a imagem

INSERIR VÍDEO
INSERIR VÍDEO

Copie o endereço (URL) do vídeo, direto da barra de endereços de seu navegador, e cole-a abaixo:

Todos os comentários são moderados pela equipe CaféPoint, e as opiniões aqui expressas são de responsabilidade exclusiva dos leitores. Contamos com sua colaboração. Obrigado.

SEU COMENTÁRIO FOI ENVIADO COM SUCESSO!

Você pode fazer mais comentários se desejar. Eles serão publicados após a analise da nossa equipe.

Assine nossa newsletter

E fique por dentro de todas as novidades do CaféPoint diretamente no seu e-mail

Obrigado! agora só falta confirmar seu e-mail.
Você receberá uma mensagem no e-mail indicado, com as instruções a serem seguidas.

Você já está logado com o e-mail informado.
Caso deseje alterar as opções de recebimento das newsletter, acesse o seu painel de controle.

CaféPoint Logo MilkPoint Ventures