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Crença cega ou desconfiança administrada?

POR BRUNO VARELLA MIRANDA

E SYLVIA SAES

BRUNO VARELLA MIRANDA

EM 26/03/2013

4 MIN DE LEITURA

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Produtores e consumidores nunca foram melhores amigos e, conforme aprendemos lendo os mais famosos economistas, está tudo bem que seja assim. Movidos pelo auto-interesse, ambos os grupos produzem melhores cenários sob um ponto de vista econômico: mais opções nas prateleiras, preços mais baixos, indivíduos em melhor posição econômica. Ainda assim, falar em um egoísmo que gera resultados positivos não representa ideia das mais populares. A publicidade das empresas, de fato, faz um trabalho hercúleo para dizer o contrário. Nada de auto-interesse, o que buscamos é proporcionar bem-estar a você, consumidor, informam as placas de publicidade. É como se o egoísmo de milhões de agentes desse lugar a uma espécie de contrato informal, em que as empresas se responsabilizam pela materialização de um cenário em que todos ganham.

Ocorre que de vez em quando tal dinâmica nos traz algumas surpresas: há apenas 1 ano, ninguém questionaria as inocentes almôndegas vendidas nos supermercados europeus. Consumidores felizes com os ótimos preços, empresas diversificando suas linhas de produto, concorrência ferrenha pelo direito de fornecer a lasanha congelada de cada dia. Egoísmo ou concórdia, o importante é que tudo parecia funcionar. Um caso de trapaça, porém, fez com que o sonho caísse por terra, ao menos por algumas semanas. Embora os riscos do consumo da carne de cavalo sejam mínimos, certo estrago foi feito. Milhares de consumidores, sentindo-se traídos, correram para o açougue da esquina. Buscavam, em tal ato, humanizar um pouco o intercâmbio, transferindo para o açougueiro um papel que a profusão de selos e sistemas de controle havia sido incapaz de desempenhar: garantir plena previsibilidade na procedência dos alimentos.

Abandonemos a visão inocente, entretanto: o que assegura a mensuração perfeita de cada detalhe daquilo que consumimos não é o grau de amizade com quem nos vende o alimento, e sim o estabelecimento de sistemas de controle adequados. E, para isso, é preciso pagar a conta de tais processos. Antes, devemos reconhecer que consumidores e produtores não estão trabalhando para um bem comum, e sim buscando realizar objetivos específicos motivados pelo auto-interesse. Afinal, se os indivíduos querem pagar o mais barato possível e as empresas maximizarem o lucro para os seus acionistas, o surgimento de um custo extra implica uma pergunta inevitável: de que forma este é distribuído entre as partes interessadas?

Por isso, não nos enganemos: escândalos como o da 'carne de cavalo' são minúsculos perto de outros desafios como o alinhamento das práticas corporativas com as metas impostas pela agenda do 'desenvolvimento sustentável', por exemplo. Para o estabelecimento de padrões realistas e efetivos, é necessário que todas as partes interessadas sentem à mesa e discutam oportunidades e desafios. Tal tarefa, no entanto, é complexa. Em primeiro lugar, muitos dos grupos de interesse possuem um nível mínimo de organização na atualidade. Quem representa os consumidores, por exemplo? Estarão dispostos a pagar por seus desejos, ou o efeito 'carona' aqui vencerá?

Ademais, discutir parâmetros exige o estabelecimento de certa estrutura, e alguém deve pagar por isso. Perguntas relevantes incluem: o responsável por acertar a conta dos debates tem algum privilégio na hora das decisões? Ou, sendo mais direto, poderá uma mesa redonda ser usada para afirmar o discurso de apenas um grupo, oferecendo propaganda ao invés de um diagnóstico claro? Outra questão interessante diz respeito à estrutura de discussão nessas estruturas. Imagine uma situação em que ONGs, empresas, governo, academia e consumidores se reúnam para discutir padrões para uma cadeia e as responsabilidades de cada um. Pois bem, terão todos os mesmos direitos a contribuir para o resultado final?

E, finalmente, é preciso reconhecer: existe considerável probabilidade de que um acordo exija importantes concessões de ao menos uma parte. Diante de interesses conflitantes – o consumidor que quer pagar o menos possível, o produtor que busca maximizar o lucro, a ONG que defende um ecossistema ou o bem-estar animal – é muito difícil dizer quem tem a razão. Ainda por cima, há a concorrência do mecanismo de mercado, capaz de oferecer soluções rápidas para uma série de questões econômicas. Entre uma solução mais efetiva, porém mais cara e demorada, e uma rápida e barata, porém capaz de empurrar os problemas para frente, não raramente optamos pela segunda opção.

Iniciativas envolvendo uma variedade de agentes - chamadas 'multi stakeholder initiatives' - já são realidade em muitas cadeias. A academia está começando a traduzir o pioneirismo dos agentes em teorias coerentes que demonstrem o seu funcionamento. Pretendemos voltar ao tema inúmeras vezes, descrevendo exemplos e debatendo os principais desafios encontrados. No momento, a principal conclusão que queremos deixar para os leitores é a de que a construção de padrões efetivos exige o diálogo entre agentes com interesses conflitantes. Tal requisito, por sua vez, lança desafios sobre a forma como as conversas devem ser organizadas, quem as patrocinará e como as decisões se materializarão em um plano de ação. Complicado, não? Talvez por isso, milhões de indivíduos, mais do que informação, busquem 'tranquilizar a consciência' ao encontrar selo X ou certificado Y nas embalagens dos produtos.
 

BRUNO VARELLA MIRANDA

Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri

SYLVIA SAES

Professora do Departamento de Administração da USP e coordenadora do Center for Organization Studies (CORS)

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KÁTIA OLIVEIRA

DIVINÓPOLIS - MINAS GERAIS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 11/04/2013

Concordo em gênero,número e grau !

Sensacional !
BRUNO VARELLA MIRANDA

SÃO PAULO - SÃO PAULO - PESQUISA/ENSINO

EM 04/04/2013

Prezado Paulo,



Muito obrigado pelo comentário. O importante é encontrar formas de canalizar essa busca pelo auto-interesse econômico para atividades que não sejam destrutivas do ponto de vista social. Afinal, a vida em sociedade implica um complexo contrato, do qual todos fazemos parte: encontrar a sintonia fina para essa interação não é fácil e é por isso que, não raramente, nos deparamos com esse choque entre os interesses de uns e o bem-estar de outros.



Aproveitamos para deixar o convite: sempre que quiser participar, o espaço é seu.



Atenciosamente



Bruno Miranda
PAULO SERGIO RUFFATO PEREIRA

RIO BONITO - RIO DE JANEIRO

EM 03/04/2013

Bom artigo, resumindo o capitalismo-lucro, jogo de interesses, cada um puxando a sardinha para sua brasa: empresas querendo produzir com " menor custo", e consumidores querendo produtos com "a menor preço", e a qualidade...para alguns, é só um detalhe.

As empresas não têm "Coração e sim CNPJ"
BRUNO VARELLA MIRANDA

SÃO PAULO - SÃO PAULO - PESQUISA/ENSINO

EM 27/03/2013

Prezados Bruno e Marcelo,



Gostaríamos de agradecer a participação no fórum. Sempre que tiverem comentários, críticas, sugestões de textos, usem este espaço para se expressarem. Da mesma forma, convidamos outros leitores a participar também.



Atenciosamente



Bruno Miranda
BRUNO DA SILVA PEREIRA

BELO HORIZONTE - MINAS GERAIS - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 27/03/2013

Concordo. Otimo artigo.

Realmente dificil de resolver, mas é necessário todos ficarem atentos ao tema.
MARCELO FERNANDES REZENDE

ORIZONA - GOIÁS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 27/03/2013

Parabéns pelo artigo!



Aguardo pelo próximo!


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