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Apesar dos meios, os fins coincidem

POR SYLVIA SAES

E BRUNO VARELLA MIRANDA

BRUNO VARELLA MIRANDA

EM 31/01/2008

6 MIN DE LEITURA

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A competição por mercados é uma guerra cujas regras, a grosso modo, são dadas pelas instituições comerciais multilaterais, e cujos exércitos são constituídos por milhares de agentes pulverizados em um espaço geográfico dotado de grande complexidade. Na cafeicultura, durante longo tempo os soldados se encontraram de mãos atadas; vinham de um comitê central (no caso brasileiro, o IBC) as principais diretrizes, e neste caso não estamos apenas falando de efeitos diretos. De forma bastante acentuada, os incentivos resultantes da adoção desta ou aquela política levavam a efeitos indiretos que moldavam o comportamento de cada um destes agentes.

Na atualidade, boa parte dos soldados envolvidos na competição pelos mercados se encontra totalmente livre para decidir qual ação tomar, e aos Estados a atuação se dá cada vez mais de forma limitada. No entanto, um importante ator na cafeicultura internacional ainda mantém acentuados resquícios do passado intervencionista. A analogia entre guerras e o Vietnã é certamente um lugar comum nos textos sobre este país; no entanto, a estratégia tomada por este país neste novo conflito saudável em nada lembra a atuação por meio da guerrilha, parcialmente descentralizada, que possibilitou a resistência do país a inimigos mais poderosos.

Em tempos atuais, a abertura da economia vietnamita é feita de forma cuidadosa, de acordo com as decisões de um limitado círculo. Apenas nos últimos anos a iniciativa privada tem passado a possuir um papel decisivo na cafeicultura vietnamita. Isso não significa, por outro lado, que a atuação estatal no Vietnã tenha perdido totalmente a importância, ou que a sociedade civil jogue um papel decisivo nos rumos dados a este setor fundamental para o país. A abertura do mercado à participação de empresas estrangeiras em alguns setores, mais que nada busca garantir a atração de capitais sem que se abra mão de um grau considerável de controle, por exemplo por meio de restrições à constituição de associações de classe.

Tal quadro é considerável quando consideramos o perfil da produção vietnamita. Cerca de 85% do café produzido no Vietnã é oriundo de pequenas propriedades, boa parte delas surgida por meio do arrendamento de terras por meio de contratos. Ou seja, o número de produtores envolvidos neste processo é enorme, e o seu poder de influenciar o setor como um todo, aparentemente minúsculo a princípio. Indo além, a existência de um notável grau de centralização poderia soar como um palco perfeito para os supracitados efeitos indiretos, muitas vezes dissonantes das tendências de mercado.

País comunista, produtor de café Robusta, o Vietnã possui um enorme potencial para atrair os mais diversos estereótipos. Por exemplo, a associação com a ineficiência poderia ser recorrente, ainda que a abertura e a perspectiva por reformas faça com que as análises recentes tenham preferido se focar em eventuais aspectos positivos. Além disso, questões como a política salarial no país, os parâmetros ambientais adotados na produção e a capacidade dos cidadãos questionarem isso são igualmente polêmicos.

Centralização = estagnação?

Esta seção não pretende discutir as vantagens de um livre mercado ou as pragas disseminadas com um regime comunista, ou híbrido, como neste caso. Basicamente, o que será feito é a discussão de cada um dos esterótipos acima, muitos dos quais nos levam a informações interessantes. Evidentemente, em cada uma das variáveis enumeradas, parece patente aquela que é a qualidade mais propagada dos vietnamitas: a competitividade devido ao baixo custo.

Em relação a este tópico, por sorte tem crescido a informação disponível acerca deste concorrente que tanto desafia nossa imaginação. Dados acerca dos custos se encontram disponibilizados na atualidade, com certo detalhamento, inclusive. Por exemplo, o custo de produção médio na região de Dak Lak em 2004 foi de R$ 940,00 por tonelada (R$ 56,40 por saca de 60kg), gastos principalmente em fertilizantes (38% do total) e água (responsável por 30% do total). Custos com mão de obra representam cerca de 15% do custo de produção total.

Irrigados em sua maioria, os cafezais vietnamitas são então alvos da fúria de diversos setores baseados no exterior. Serão ambientalmente irresponsáveis, dirão alguns. A mão de obra é explorada, dirão outros. Sua viabilização só foi possível devido a políticas de financiamento cujas distorções prejudicaram concorrentes mais eficientes, finalmente será escutado. Enfim, todos estes argumentos, unidos ao fato de que a administração do setor no país é centralizada, poderiam levar a seguinte conclusão: o Vietnã é um concorrente desleal, e assim o será enquanto esse quadro se mantiver. Nesse sentido, haverá resposta do outro lado do campo de batalha?

Imagem é tudo

Nos últimos anos, as atenções dos pesquisadores vietnamitas têm se voltado justamente para algumas dessas importantes questões. Estudos realizados pelo Instituto de Política e Estratégia para a Agricultura e Desenvolvimento Rural (IPSARD) mostram que o desperdício de água nos cafezais do Vietnã é imenso, qualquer que seja o sistema de irrigação utilizado. Da mesma forma, a utilização de fertilizantes em excesso se encontra na mira dos pesquisadores do país. Os anos de vacas magras, no início dos anos 2000, demonstraram que a redução de quase a metade da quantidade de fertilizantes nas lavouras manteve os mesmos níveis de produtividade. Nos últimos anos o foco tem sido em tentar reduzir alguns desses problemas, por meio da atuação junto aos proprietários.

A preocupação com o meio ambiente, neste caso refletida no temor de que o uso excessivo de água contribua para a erosão e o empobrecimento do solo, carrega consigo metas de longo prazo, como a idéia de sustentabilidade na produção. Por outro lado, o que está em jogo agora, tanto para vietnamitas como para todos os países produtores do mundo, é a imagem que a produção carrega no exterior. Ora, é contra os estereótipos que estão lutando os vietnamitas, e isso não apenas tem a ver com o peso das críticas feitas por agentes do setor, como também com o fato de que melhorar a imagem pode significar maior eficiência.

Ou seja, economia de água, uso controlado de fertilizantes, entre outras medidas, significam não apenas um passo adiante na busca por sustentabilidade, como garantem maior competitividade a um país produtor. Pesquisas como as conduzidas pelo IPSARD, além da preocupação com questões sociais ambientais, consideram em primeiro plano a competitividade da cafeicultura vietnamita e qual a imagem da mesma fora do país. Gastar menos água significa antes de tudo uma redução nos custos de produção, e com isso a maior competitividade do café vietnamita.

Conclusão

Vez ou outra, críticas aos concorrentes do Brasil na cafeicultura são ouvidas, no sentido de que a nossa eficiência vem sendo punida pelo jogo sujo de outros agentes. No entanto, em diversos casos, uma guinada em direção à superação dos estereótipos pode significar um desafio ainda maior para nós; um Vietnã com melhor imagem e menores custos de produção certamente seria um adversário ainda mais difícil de bater. E neste ponto, o objetivo final pouco difere para o caso de um comitê central centralizador ou um grupo pulverizado de produtores com voz ativa. O que predomina é a busca por um lugar ao Sol.

As regras do jogo estão dadas; cada exército perfilado procura jogar com as armas que tem. Do outro lado do campo de batalha, está um concorrente com diversas peculiaridades, mas que vem buscando nos últimos anos entender melhor o mundo à sua volta e se adequar a ele. Para nós, mais que reclamar de eventuais desrespeitos observados dentro da "fronteira inimiga", só resta o olhar atento em relação aos movimentos adversários, e se possível a otimização de nossas próprias armas. Em um mundo marcado pela competição por mercados, a análise é regra tanto como a ação.

SYLVIA SAES

Professora do Departamento de Administração da USP e coordenadora do Center for Organization Studies (CORS)

BRUNO VARELLA MIRANDA

Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri

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