Escrevo este texto inspirado pelo artigo de Sylvia Saes e Bruno Varela na seção Conjunura de Mercado. Quero parabenizá-los pela clareza de sempre. Também vinha evitando me manifestar nessa polêmica, "pra não dar água pra defunto".

A falta de consistência da proposta de rotulagem já foi demonstrada na outra vez em que esta veio a tona, lá em 2002. E corroborada pelo fato do Brasil vir, concomitantemente ao aumento do uso de conilon nos blends, apresentando as maiores taxas de crescimento de consumo de café do mundo.

É provável que exista relação de causa e efeito entre os dois fatos, devido ao uso de matéria-prima mais barata (nem tanto assim, pois quem saiu do blends foram arábicas baixos). Num quadro de reajuste do preço de venda das indútrias abaixo da inflação acumulada, desde 1994, isto pode ter sido decisivo para a manutenção de suas margens. E o preço baixo, sem comprometimento da qualidade, estimulou e estimula o consumo.

O que importa ao consumidor é o padrão da bebida que está nas suas xícaras. Caso houvesse rejeição ao aumento do uso de conilon, ele estaria abandonando o consumo de café, o que está mais do que provado que não ocorre.

Outro ponto que enfraquece o argumento da rotulagem é que se busca comparar o conilon e seus defeitos (que, feliz ou infelizmente, podem e devem ser significativamente diminuídos) com arábicas superiores, não com os arábicas baixos. O erro mais comum do processamento do conilon é a secagem a altas temperaturas, com fogo direto, levando a problemas para estocagem e ao gosto de fumaça. Pergunte a seu cliente, torrador, o que é mais prejudicial à bebida, cheiro de fumaça ou fermentação? E pergunte também qual o giro médio de seu estoque de matéria-prima.

Não sou provador de café, muito menos formulador de blends, mas aprendi com estes últimos, e os admiro por isso, que uma das grandes "ciências" da arte é fazer bebidas muito semelhantes, porém compostas de grãos diferentes, explorando suas complementariedades. Isso propicia extrair todo o potencial de grandes cafés que, como o clima, variam de ano a ano. E quem procura nuances (que não é o consumidor médio) que explore o nicho dos estate coffees.

Vale ressaltar que a possível explicitação da presença no blend mantém aberta a oportunidade de mercado para que produtores de conilon (ou suas cooperativas) montem projetos visando a oferta, em volume significativo e estável, de produto de qualidade diferenciada, de preferência, sem elevação drástica nos seus custos. E, desde 2002, não houve avanços concretos nesse sentido. Um dia as margens do conilon hão de cair (tomara que já não estejam caindo!) e quem tiver demanda garantida certamente terá vantagens competitivas.

Se eu consumo seu produto e sei que ele é bom, eu vou querer mais dele.

Parece faltar essa percepção aos produtores de conilon, que acabam sendo atraídos pela zona de conforto representada pela boa remuneração dos últimos anos. Depois da bonança vem...