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Somos todos culpados

POR SYLVIA SAES

E BRUNO VARELLA MIRANDA

BRUNO VARELLA MIRANDA

EM 14/04/2009

4 MIN DE LEITURA

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Realizada em Londres, a Reunião do G20 não deverá ficar marcada pelo momento em que ocorreu. Afinal, é impossível afirmarmos que uma solução duradoura para a crise tenha sido lá encontrada, de modo que provavelmente vejamos outros encontros da mesma magnitude lidando com o tema. Na verdade, o que mais notabiliza essa reunião é, além da presença dos chamados países emergentes nos debates, a estreia do presidente Barack Obama em eventos de tal porte.

Principal personagem do encontro, o líder americano deu mostras de seu bom humor ao fazer elogios ao presidente Lula, em cenas amplamente divulgadas pela imprensa brasileira. Porém, tais atitudes carecem de importância quando vistas sob um contexto mais amplo, ainda mais tendo em vista que essa característica do novo presidente dos EUA já havia sido mostrada em outras oportunidades. Pra quem achava que Obama seria apenas presença de espírito, suas primeiras ações na Casa Branca vem mostrando exatamente o contrário.

Disposto a eliminar qualquer resquício de desconfiança em relação à sua capacidade de conduzir a comunidade internacional, Obama não tem fugido da raia. De fato, muitos analistas demonstravam preocupação com a falta de experiência do novo presidente americano, cuja limitada trajetória política parecia insuficiente para lidar com os enormes desafios do momento. Por isso, chama a atenção a capacidade que Obama vem tendo de manter a ousadia do discurso de sua campanha, mesmo naqueles pontos considerados mais polêmicos.

Nesse sentido, mais importante que os elogios a Lula foi a declaração de Obama de que o mundo não deveria pautar seu crescimento no consumismo norte-americano. A princípio, tal declaração soa como uma resposta a uma necessidade urgente, dado que, após anos de crescimento desenfreado do crédito, ao que parece os efeitos colaterais de tais práticas parecem ter conscientizado o governo dos EUA de sua inconveniência. Entretanto, colocar tal plano em prática não será uma tarefa tão óbvia, e isso porque poderia afetar a própria popularidade de Obama.

Conforme sabemos, a gravidade de tal crise deriva da posse, por parte dos bancos, de uma grande quantidade de títulos podres, resultado de uma alavancagem exagerada dessas organizações. Por isso, a ganância dos banqueiros "de olhos azuis" certamente é um fator a ser considerado nas explicações para a atual crise financeira. No entanto, é vital lembrarmos que parcela considerável da alavancagem exagerada dos bancos se destinou a financiar os sonhos das classes mais baixas da população norte-americana.

Ao longo dos últimos anos, viveu-se uma ilusão de que nos EUA todos poderiam comprar aquilo que bem entendessem. Deseja uma casa nova: faça uma dívida! Um carro, uma faculdade, bens de consumo dos mais variados: idem! Interessadas em fazer parte desse quimera, as instituições financeiras criaram mecanismos bastante sofisticados, com o objetivo de emprestar o máximo possível. Obviamente, isso era interessante para os bancos, uma vez que podiam girar recursos bastante superiores aos efetivamente possuídos; porém, o fundamental é que havia demanda voraz por esse "dinheiro de mentira", e com a conivência não só do governo norte-americano. Tomando um exemplo das bandas de cá, quem seria capaz de criticar "o espetáculo do crescimento"?.

Dessa forma, controlar os bancos, em algum momento, significará também apertar os cintos da população, que não teria mais acesso ao crédito fácil de outros tempos. Em tempos de crise, tais medidas podem ser tomadas facilmente, dado que a possibilidade de um empréstimo se encontra distante da maioria das pessoas; porém, o difícil será segurar o ímpeto da sociedade americana quando dias melhores chegarem, e com isso, a ambição de todos começar a criar oportunidades para o crescimento de uma nova bolha.

Não pretendemos nos aprofundar no debate da crise, até porque muito já tem sido dito acerca da atual situação. Importante aqui é salientarmos que visões maniqueístas da crise, como aquela apresentada pelo presidente Lula, são absolutamente imprecisas. Da mesma maneira, vale lembrar que uma eventual reconstrução do sistema financeiro internacional que não leve em conta tal dilema de maneira séria certamente fracassará em algum momento.

Intrínseco ao sistema capitalista, algum nível de concentração de renda sempre vai haver em uma sociedade que opte por essa forma de organização. Assim, a principal função de um governo nesse contexto deve ser a de organizar a competição entre os cidadãos, de modo que as regras sejam claras e a disputa entre cidadãos em iguais condições. Nesse sentido, Obama acerta ao perseguir reformas nos sistemas de saúde e educação dos EUA. Ao buscar a melhora no oferecimento de serviços básicos à população, o atual governo fortalece as condições de todos competirem em melhores condições por um futuro melhor.

Mais fácil seria esperar o mau momento passar e, em um futuro indeterminado, voltar à mesma ciranda de crédito fácil, endividamento exagerado, e consequentemente, a destruição dos castelos de areia de milhões de pessoas. É difícil não cair nessa tentação, porém vale frisarmos que o sucesso de um sistema econômico não depende do livre acesso de todos a bens de consumo, muitos dos quais desnecessários para uma vida com qualidade. Para o êxito de uma sociedade, é necessário um olhar voltado para a perenidade do modelo adotado.

Por tudo isso, ao afirmar que os EUA adotarão uma nova trajetória, o presidente Obama manda um recado não apenas para o restante da comunidade internacional, que ao longo das últimas décadas vinha se dedicando a aproveitar da melhor forma possível a ânsia por consumo dos norte-americanos. Ao fazê-lo, as palavras de Obama trazem impactos diretos também para a sociedade dos EUA, tão acostumada a um ritmo irreal de busca por crédito.

Finalmente, cabe indagar se um processo de reeducação dos consumidores norte-americanos motivaria discussões acerca de outro tópico igualmente polêmico: a pressão sobre os recursos naturais decorrente da adoção do "American way of life". Conforme vai ficando cada vez mais claro, nosso planeta não suportaria a extensão do padrão de consumo norte-americano aos quatro cantos do globo; portanto, seria interessante caso este modelo chegasse a ser discutido de maneira ampla entre seus maiores usuários. Até o momento, tal hipótese parece improvável.

SYLVIA SAES

Professora do Departamento de Administração da USP e coordenadora do Center for Organization Studies (CORS)

BRUNO VARELLA MIRANDA

Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri

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