Início de safra é um momento de apreensão para a cafeicultura. Estimada pela Conab em 40,6 milhões de sacas, a safra 2006/2007 de café do Brasil começa a ser colhida neste mês. O resultado, 23% superior ao do ano passado, teve de ser recalculado devido à falta de chuvas no sul de Minas Gerais, que provocou a queda de produtividade na região. Uma vez iniciada a colheita, aumentam as expectativas dos produtores em relação às condições de venda do café nos próximos meses, que deverá estar condicionada pelos seguintes fatores:
Demanda e Oferta Mundiais:
No curto prazo, o mercado deverá se manter em equilíbrio, o que garante que a oferta não pressionará os preços. Praticamente toda a safra atual será consumida, sendo o excedente alocado na formação de estoques estratégicos para o próximo ano, quando a produção deve cair.
Ganha importância crescente a demanda interna, que cresce a uma taxa maior que a procura internacional, sobretudo devido aos investimentos realizados em propaganda e melhoria da produção. Espera-se que esta taxa mantenha sua trajetória de crescimento, confirmando-se a tendência de aumento do consumo de café fora do lar, além da progressiva conscientização da comunidade médica acerca dos benefícios do consumo de café para a saúde.
O anúncio da liberalização de R$ 1,578 bilhão do Funcafé para o financiamento da colheita, estocagem e compra do café verde na atual safra busca melhorar as condições de venda do produto. Espera-se que estes recursos auxiliem os produtores a esperarem melhores condições de venda, fator fundamental para a organização da entrada da safra, e assim os preços não caiam devido a um aumento expressivo na oferta na entrada da safra.
Em relação às exportações, o resultado brasileiro tem sido inferior ao obtido no mesmo período do ano passado. A explicação encontrada é a de que a safra 2005/2006 foi reduzida, o que mantém os estoques internos em um nível baixo. Este dado influencia diretamente as estatísticas de exportação mundial da Organização Internacional do Café (OIC), que se encontram em trajetória de queda em comparação a 2005. O fato de o Brasil ter embarcado 25% menos café em março de 2006 contribuiu para que o levantamento da OIC apontasse uma queda global de 7,7% dos embarques de café.
Na bolsa de Londres, vem sendo observada uma tendência de alta desde março. Apesar de perder fôlego no final de abril, o índice LIFFE tem se mantido na faixa entre os US$110 e US$120. A trajetória observada em Londres contrasta com a lentidão dos negócios na bolsa de Nova Iorque, onde a negociação de contratos de café arábica segue à espera de maiores notícias acerca das condições de safra no Brasil.
Os preços internacionais do café arábica resistem em subir, apesar da retração da oferta em relação à demanda mundial. Na bolsa de mercadorias de Nova Iorque (NYBOT) o mês de abril foi marcado pela lentidão nas negociações. Com isso, o índice CEPEA fechou abril com queda de 2% em relação ao mês anterior. Analistas prevêem que a ocorrência de geadas nas regiões produtoras pode dar suporte aos preços no mercado internacional.
A tendência do mercado, conforme foi apontado anteriormente, é a de equilíbrio, o que se refletirá no preço nos próximos meses. Uma maior propensão de venda por parte dos produtores, motivada pela necessidade de pagar os gastos da colheita pode contribuir para a baixa nas cotações. Da mesma forma, como o exemplo da NYBOT deixa claro, o clima poderá ser um fator decisivo para a alta nos preços de café arábica no próximo mês.
O índice CEPEA/ESALQ do café robusta registrou queda no último mês, chegando a R$ 152,46 no dia 12/05, contra R$ 173,24 em 12/04. O principal destino do café robusta brasileiro foi a indústria torrefadora, como aponta o CEPEA em seu último boletim. O resultado das exportações de robusta brasileiro do Brasil foi modesto, em grande parte devido à concorrência de outros produtores, como o Vietnã.
Fonte: CEPEA / ESALQ
Em comparação com os últimos meses, vem diminuindo o diferencial de preços entre o café robusta e o arábica. No mês de abril de 2006 este valor chegou a R$ 81,67. O resultado, apesar de não ser tão expressivo como o de março (R$74,69), ilustra o momento favorável para os produtores brasileiros de café robusta. Basta lembrarmos que há um ano este diferencial chegou a bater em R$187,00. Neste ano, são observados preços 20% superiores nas regiões produtoras de café Conilon em relação ao ano passado.
Um estudo divulgado pelo Deutsche Bank traz boas notícias para diversos setores do agronegócio. De acordo com o banco alemão, há uma forte tendência de valorização dos preços de algumas commodities.
No caso do café, esta alta é estimada em torno de 235%, sendo sustentada, sobretudo por um crescimento da economia mundial nos próximos anos. No entanto, o Deutsche Bank afirma no mesmo relatório que uma mudança brusca na trajetória econômica mundial poderia trazer efeitos indesejáveis para o agronegócio de diversos países, como o Brasil.
Câmbio e Custo de produção
A valorização do real frente ao dólar vem sendo apontada como a grande vilã do agronegócio brasileiro, e do café em particular, nos últimos meses. Isso significa menores receitas aos produtores e perda de competitividade frente aos concorrentes. Da mesma forma, diversas vozes no setor vêm chamando atenção para os altos custos de produção da cafeicultura.
Mas, se em relação ao câmbio há um consenso, o mesmo não pode ser dito dos custos de produção, já que o quadro brasileiro é marcado pela heterogeneidade. As diferenças iniciam no tipo de espécie (conilon, arábica), passando pelas formas de colheita (mecanizada, manual), adensamento e beneficiamento. Neste sentido, é difícil considerar os dados médios como uma radiografia da cafeicultura nacional.
Por esse motivo o documento divulgado recentemente pelo Conselho Nacional do Café (CNC) deve ser analisado com atenção. De acordo com o CNC, a situação da cafeicultura na atualidade é crítica, e a falta de medidas de auxílio por parte do governo poderia agravar a situação econômica dos cerca de 1900 municípios dependentes do café. Nem mesmo a recuperação dos preços, ocorrida no final de 2004, foi capaz de reverter o delicado quadro enfrentado pelos cafeicultores. As perdas do período de preços baixos, segundo o CNC, são da ordem de US$ 2,5 bilhões.
Como mostra o gráfico abaixo, durante todo este período a média do custo unitário de produção de saca de café se situou acima da média de preços do produto. Tal situação conforme observado anteriormente retrata uma média, o que significa muito pouco dada à alta variância entre os produtores.
Obs1: Dados obtidos no Sul de Minas.
Obs2: Produtividade: 20 sacas / hectare de café arábica.
Fonte: Cooperativas in CNC
Para o CNC, a estreita margem de lucro do negócio cafeeiro tende a deteriorar as condições de vida de boa parte dos produtores. O relatório do CNC afirma que cerca de 90% dos produtores vivem com menos de um salário mínimo por mês, graças ao alto custo de produção da saca de café se comparada com os preços. Dessa forma, não é de se estranhar a opinião de diversos analistas do setor, que apontam para o progressivo desaparecimento dos médios produtores em caso de manutenção deste quadro. Vale observar que os analistas prevêem tal tendência ao analisar as características diferenciadas dos produtores. Os grandes em geral, possuem escala e alta produtividade, o que significa condições diferentes da retratada no quadro acima e os pequenos utilizam métodos de colheita redutores de custos, tal como parcerias e meação. Isso sem mencionar produtores de cafés diferenciados que obtêm preços bem superiores aos obtidos em média pelos demais produtores.
De acordo com o documento, os baixos preços internacionais do café durante o período entre 2001 e 2004 provocaram o endividamento da maioria dos produtores. Vale também ressaltar que o endividamento encontra-se concentrado, e grande parte da cafeicultura honra suas dívidas. O endividamento deveria ser analisado caso há caso para não prejudicar o setor como um todo e aqueles que investiram em tecnologia na contramão do câmbio. A visão de endividamento geral sinaliza de forma negativa para um agronegócio que precisa de recursos para investir. Qual o investidor que se arriscaria a emprestar para um setor endividado que não honra seus compromissos?
Dinâmica de novo agronegócio
Uma pesquisa conduzida pela CNA trouxe uma série de dados importantes sobre a cafeicultura. Entre elas, chama atenção a grande porcentagem de entrevistados que disseram estar interessados na busca por novos nichos mercadológicos. A preocupação com a ampliação do parque cafeeiro vem dando lugar a uma busca pela agregação de valor ao resultado das safras. Aumentou o interesse dos produtores pela produção de cafés especiais e orgânicos, mercados bastante promissores.
Portanto, os cafeicultores se encontram focados em uma série de variáveis no atual contexto: torcem por uma política cambial mais favorável ao agronegócio, esperam recursos para colheita e estocagem e olham atentamente para as previsões meteorológicas, que podem influenciar o movimento dos preços no próximo mês.
Por outro lado, os produtores de café sabem que o momento é de busca por novos mercados e pela melhoria da produção. Apesar das dificuldades para a realização de investimentos, exemplos como o de aumento do consumo interno ou a expansão do consumo de cafés especiais e orgânicos são alentadores, dando mostras que ainda há espaço para uma expansão. Nesse sentido, o incremento nas receitas dos cafeicultores deverá vir nos próximos anos principalmente por meio de uma melhoria qualitativa da produção, ao invés do mero crescimento quantitativo.