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O uso do conhecimento na cafeicultura

POR EDUARDO CESAR SILVA

ESPAÇO ABERTO

EM 24/07/2015

6 MIN DE LEITURA

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Por Eduardo Cesar Silva, doutorando em administração pela Ufla, tecnólogo em cafeicultura pelo IF Sul de Minas e coordenador do Bureau de Inteligência Competitiva do Café

O economista Thomas Sowell explica que existem basicamente duas visões sobre o papel do conhecimento da sociedade, as quais ele chama de “visão restrita” e “visão irrestrita”[1]. Os defensores da visão irrestrita acreditam que a sabedoria de poucos especialistas seria suficiente para solucionar os grandes desafios de uma sociedade, elaborando políticas públicas e econômicas com resultados ótimos. Nesse processo, a realidade pode ser completamente reformulada de maneira intencional e planejada, com intuito de que os resultados futuros sejam melhores. Na visão restrita, o conhecimento necessário para resolver o problema da pobreza ou da violência em uma determinada sociedade poderia ser perfeitamente alcançado e posto em prática. Organizar a sociedade e a economia seria algo parecido com a organização das peças sobre um tabuleiro de xadrez.

Foto ilustrativa: Érico Hiller/ Café Editora
 
Foto ilustrativa: Érico Hiller/ Café Editora

Já a visão restrita se mostra cética diante dessa capacidade de articulação do conhecimento. Ela parte da constatação de que a realidade social e econômica é extremamente complexa, com inúmeras variáveis que não podem ser calculadas com precisão. Com isso, tentativas planejadas de modificar uma sociedade ou controlar a economia podem gerar resultados inesperados e prejudiciais. Para esta visão, o conhecimento se articula de maneira sistêmica através da sociedade, criando soluções espontâneas para os problemas. Nessa concepção, a economia de mercado permite que milhões de agentes econômicos se articulem pelo mundo todo, sem a necessidade de um planejador central. Os preços e o conhecimento individual de cada agente são suficientes para determinar o que é viável ou não.

Um bom exemplo dessa articulação pode ser observado no processo de fabricação de um simples lápis. Embora pequeno e frágil, esse objeto depende da ação de milhares de profissionais espalhados pelo mundo. É necessário plantar, cortar e processar a madeira; extrair os materiais que formam a grafite; obter látex para a borracha e metal para o cilindro que a mantém unida ao lápis. Além disso, há os profissionais envolvidos no transporte desses materiais e aqueles que produzem os alimentos que todos os envolvidos no processo necessitam. Toda essa cadeia é articulada com base apenas nas informações de preço e da combinação do conhecimento individual de cada um dos envolvidos.

Os agricultores, por exemplo, não produzem alimentos pensando em contribuir para a fabricação de lápis. Eles apenas produzem e vendem de acordo com os preços do mercado e o próprio mercado se encarrega de fazer com aqueles alimentos cheguem até os profissionais envolvidos na cadeia produtiva do lápis, como engenheiros florestais, operadores de máquinas e caminhoneiros. Não é preciso que um grupo de burocratas determine que uma dada quantidade de alimento seja produzida exclusivamente para garantir a produção de lápis[2].

Um dos grandes defensores da visão restrita do conhecimento foi o economista Friedrich Hayek, ganhador do Nobel de Economia de 1974. Em um artigo clássico, publicado em 1945, cujo título é The Use of Knowledge in Society (O Uso do Conhecimento da na Sociedade), ele argumenta sobre a importância do conhecimento que é exclusivo de cada indivíduo e não pode ser acessado pelos planejadores. Isso significa que cabe ao empresário definir o que será vendido, quanto e a qual preço, já que ele é o único que conhece seus próprios custos, o montante disponível para investir e as preferências dos consumidores locais em dado momento.

É por isso que intervenções do governo na economia são tão problemáticas. Um grupo de políticos e especialistas, por melhores que sejam suas intenções, não conseguirá levar em consideração todas as variáveis possíveis. Nos casos mais extremos, tentativas de controle centralizado da economia resultaram em fome, pobreza e atraso tecnológico, como na antiga União Soviética e na China de Mao. Mesmo tentativas mais restritas e locais geram resultados imprevistos. O congelamento de preços, por exemplo, é posto em prática para beneficiar os consumidores, minimizando o impacto da inflação, mas ao limitar as possibilidades de ganhos dos fabricantes e dos vendedores, estes deixam de produzir e vender. Na agricultura, planos elaborados de forma centralizada também geram efeitos negativos. No Zimbábue, a reforma agrária e o tabelamento de preços na década de 1990 reduziram a produção de cereais a menos da metade e praticamente acabaram com a cafeicultura.

Mas isso não significa que toda ação governamental prejudique a economia. A garantia de direitos e liberdades pelo Estado é fundamental para o desenvolvimento econômico. Para o economista William Easterly é justamente a ausência de direitos e liberdades que impede o desenvolvimento econômico das nações pobres. Em comum, quase todos os países pobres possuem governos corruptos, instituições fracas, leis ruins e direitos sem garantias. Nessas condições, não há política econômica ou ajuda financeira internacional que seja suficiente para melhorar efetivamente a vida dos cidadãos das nações pobres[4].

Aqui é preciso fazer uma importante distinção. O governo garantir direitos e liberdades é muito diferente de criar políticas públicas para o desenvolvimento da economia. Ao garantir o cumprimento dos contratos, da propriedade privada e reduzir a violência, o Estado permite que o mercado se desenvolva de maneira “espontânea”, com os agentes econômicos tomando decisões baseadas em preço e outros critérios. Quando o governo se propõe a regular os preços, decidir sobre quantidades ofertadas e criar burocracias ineficientes, isso cria distorções no mercado.

No Brasil predomina a visão irrestrita do conhecimento e isso afeta imensamente as políticas econômicas e sociais do país. Economistas e políticos acreditam que basta elaborar uma política pública e determinado problema será resolvido. Mas o que se vê na prática são inúmeras consequência inesperadas que surgem e prejudicam a consecução dos objetivos estabelecidos. Organizar a sociedade não é tão simples quanto organizar um tabuleiro de xadrez.

Na cafeicultura acontece a mesma coisa. Nos espaços virtuais onde se discutem os problemas do café no Brasil, são comuns as propostas que resolveriam tais problemas com a intervenção direta do governo em duas ou três variáveis do mercado. Existe a crença de que uma cadeia produtiva tão grande e complexa, integrada ao mercado internacional, pode ser completamente modificada, para melhor, com a imposição de algumas medidas planejadas.

É de amplo conhecimento os problemas das estatais brasileiras e das políticas públicas nacionais, mas ainda assim há esperança de que na cafeicultura isso vai funcionar maravilhosamente bem. As demandas são as mais variadas e impossíveis: uma estatal para industrializar o café brasileiro e competir com as multinacionais, proibir novos plantios de café para reduzir o aumento da produção e fechar os registros de exportação são alguns exemplos. O problema de todas essas propostas é a confiança na visão irrestrita. É impossível prever os resultados inesperados. Como os concorrentes irão reagir? Como os compradores irão reagir? É justo proibir que um cafeicultor eficiente amplie sua lavoura? Além disso, todas as medidas exigiriam um aumento ainda maior da presença do Estado na cafeicultura. Ou seja, mais burocracia, mais regras e maior gasto de dinheiro público.

A partir da visão restrita, a melhor alternativa para o setor seria a cobrança por medidas que facilitem a ação dos agentes econômicos envolvidos. Redução de impostos, revisão de algumas normas trabalhistas, maior agilidade na análise e aprovação de defensivos são alguns exemplos de ações que podem ser realizadas e que “facilitariam a vida” daqueles que estão envolvidos com a cafeicultura. Recentemente, foi zerado o imposto que incidia sobre a importação de cápsulas e máquinas de café, o que favorece o desenvolvimento do mercado interno. A polêmica sobre o emplacamento de tratores rurais também foi resolvida e os produtores ficaram livres de uma burocracia adicional (e desnecessária). A conclusão é que existe uma outra maneira de promover o desenvolvimento da cafeicultura e essa alternativa não depende da intervenção direta do Estado nos preços ou nas exportações.

REFERÊNCIAS
[1] SOWELL, Thomas. Conflito de Visões: Origens Ideológicas das Lutas Políticas. São Paulo: É Realizações, 2011. 278 p;
[2] Sobre esse exemplo, veja o vídeo “Eu, o lápis” disponível em . Acesso em 20 mai. 2015.
[3] HAYEK, Friedrich August. O uso do conhecimento na sociedade. Disponível em . Acesso em 20 mai. 2015.
[4] EASTERLY, William. The Tiranny of Experts: Economists, Dictators, and the Forgotten Rights of the Poor. New York: Basic Books, 2014. 416 p.

EDUARDO CESAR SILVA

Coordenador do Bureau de Inteligência Competitiva do Café.

Doutorando em administração pela Universidade Federal de Lavras e mestre em administração pela mesma instituição.

É tecnólogo em cafeicultura pelo IF Sul de Minas - Campus Muzambinho.

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VALMIR

EM 13/11/2015

bom dia eduardo estou começando agora no ramo de café e gostaria de pegar algumas informaçoes com vc em relação do primeiro plantio fundo ca cova e adubação correta no ato do plantio.
EDUARDO CESAR SILVA

LAVRAS - MINAS GERAIS - PESQUISA/ENSINO

EM 07/08/2015

Prezado José Geraldo,



Agradeço seu comentário.



Abraços!
JOSÉ GERALDO DE ANDRADE

LAVRAS - MINAS GERAIS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 04/08/2015

Bom artigo, consistente, mostrando a realidade da política agrícola do país. Parabéns!

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