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Atividade agropecuária e satisfação pessoal: é só uma questão de preço?

POR SYLVIA SAES

E BRUNO VARELLA MIRANDA

BRUNO VARELLA MIRANDA

EM 14/09/2010

3 MIN DE LEITURA

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"O Jornal Nacional deveria mostrar a cara dos inúmeros Zé Manés que estão produzindo alimento e dando o que comer às grandes cidades. Além de produzir alimentos, os Zés cuidam do meio ambiente , protegem as águas e dão emprego a milhões de pessoas, tudo do bolso do Zé... O que mais querem? O sangue nosso... Vivemos uma verdadeira agricultura de dar e não receber nada, nem mesmo o reconhecimento... (grifo nosso). Quando falamos que somos produtores, somos tachados de exploradores do meio ambiente, poluidores, senhores de terra que exploram a mão-de-obra e grandes devedores em bancos... Por isso, cabe às entidades da classe ajudarem a mudar nossa imagem!!!"

Nessa quinzena, pedimos licença a um leitor para usar sua carta como exemplo. O relato em questão é o do engenheiro agrônomo Diogo Macedo, publicado em resposta a nosso penúltimo artigo. Nele comentávamos a "Carta do Zé Agricultor ao Luis da Cidade", texto encontrado em diversos sítios da Internet. A razão de usarmos esse depoimento é simples: cremos que ele nos permite refletir sobre a própria condição da vida no campo.

O que nos leva a usar a carta do Diogo como ponto de partida para este texto é sua semelhança com relatos ouvidos em outras ocasiões. Seja por meios virtuais ou no contato pessoal, a percepção de muitos brasileiros é a de que a atividade rural se encontra desvalorizada. Ao usarmos o termo "desvalorizada", não nos referimos apenas a aspectos monetários; pelo contrário, estes explicam apenas parte do problema.

A "desvalorização" da atividade rural no Brasil se deve também ao jeito como os indivíduos a interpretam. Trata-se de uma discussão em que é importante considerar tanto a percepção daqueles que produzem no campo quanto da sociedade como um todo. É importante salientar, porém, que parcela considerável dessa "desvalorização" é explicada pela própria dinâmica das zonas rurais brasileiras.

Passemos, então, a um exemplo histórico que elucida nossas pretensões. No início da carreira acadêmica, Max Weber (1864 - 1920), um dos mais influentes sociólogos da história, estudou os trabalhadores agrícolas na Alemanha. A conclusão a qual chegou, resumida por dois pesquisadores norte-americanos, Neil Smelser e Richard Swedberg, é a seguinte:

"Ao traçar os padrões de imigração dos trabalhadores, Weber notou que estes eram menos influenciados por considerações de ganho econômico do que por seu desejo de se libertar das condições opressivas no campo. O que mais os fazia tomar a decisão de sair era a mágica da liberdade".

As conclusões de Weber, obtidas em um estudo publicado em 1895, são extremamente atuais. Afinal, mostram que o cálculo econômico, embora contribua para as decisões dos indíviduos, não constitui a única variável considerada. É necessário levar em conta as características da sociedade em que vivem os humanos, bem como a interação entre o entorno e as preferências individuais. Naquele momento histórico, a busca por liberdade levou milhões de europeus a cruzar o oceano, principalmente para os EUA.

Avançando cerca de um século, a busca por maior proximidade das novidades trazidas pela "globalização" contribui para que milhões de jovens deixem as zonas rurais, ainda que para obter uma remuneração semelhante em muitos casos. Um número enorme de indivíduos, da mesma maneira, ao se referirem à atividade agropecuária, argumentam que esta é coisa do passado, e que somente os "velhos" ficam presos ao campo.

Pois bem, com o estudo de Weber queremos enfatizar que a discussão econômica, embora muito importante, não engloba todos os dilemas do campo. Na maior parte do tempo, preço e eficiência estão no centro do debate, como uma espécie de "juízes" capazes de decidir a sobrevivência de nossos agricultores. Trata-se de uma abordagem insuficiente, porém. Indo além, é necessária uma reflexão sobre como entendemos a ruralidade no Brasil. Afinal, nem mesmo os ganhos crescentes de "eficiência" têm sido capazes de interessar as novas gerações na atividade.

Mais especificamente, a concepção que temos sobre o sentido da atividade agropecuária precisa de transformações. Não que isso seja um privilégio do campo; a visão de sociedade industrial, tão presente na cidade, igualmente precisa de revisão. No caso específico da zona rural, é necessário refletir sobre maneiras de reinserir seus moradores nas correntes mais dinâmicas da vida em sociedade, oferecendo-lhes a possibilidade de se sentirem parte de algo maior que sua atividade.

As respostas para essa demanda, apesar do auxílio da academia, dependerão enormemente da ação ativa daqueles que vivem o cotidiano do campo. Seja por meio da exploração de novos negócios, ou ainda pelo fortalecimento da vida em sociedade, é fundamental compreender os processos que envolvem seres humanos além das variáveis estatísticas. Aos que consideram essa discussão exageradamente abstrata, fica a pergunta: não seria a noção de eficiência econômica, variável central nos debates atuais, também caracterizada por considerável grau de abstração?

SYLVIA SAES

Professora do Departamento de Administração da USP e coordenadora do Center for Organization Studies (CORS)

BRUNO VARELLA MIRANDA

Professor Assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missouri

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ROBERTO TICOULAT

SÃO PAULO - SÃO PAULO - PRODUÇÃO DE CAFÉ

EM 20/09/2010

Prezados Sylvia e Bruno,

Excelente tema, pois temos de estudar as razões que movem as pessoas a sairem do campo para as cidades. No passado tínhamos o paradoxo em maior grau, e hoje, ainda mas, com grau menor, das disparidades entre as cidades "do interior" versus as "capitais".

A situação da agrigultura da época do Max Weber se alterou muito mas, especialmente no Brasil, ainda tem muito a mudar. em especial com relação à rentabilidade e à segurança de produzir. Não são poucos os exemplos de baixa remuneração, muitas vezes com o produtor vendendo seu produto abaixo do preço mínimo, assim como as perdas acumuladas por falta de seguro agrícola.

Nosso produtor tornou-se muito eficiente da porteira para dentro mas, muito temos de melhorar da porteira para fora. O problema ainda fica mais dificil de ser tratado com a difusão de lideranças no setor.

Vivemos com certeza um problema de imagem e somos cerceados em nossas atividades todos os dias pelo setor publico que, ao invez de nos enxergar como parceiros, nos enxergam como vilões.

Parabéns pelo artigo por trazer um tema tão importante para o setor.

Roberto
CARLOS EDUARDO COSTA MARIA

ANHEMBI - SÃO PAULO - INSTITUIÇÕES GOVERNAMENTAIS

EM 20/09/2010

Legal, o tema deste artigo,malgrado, como os própios autores insinuam, a sua abstração, mas que abre perspectivas de debates para várias questões.Embora, a atividade rural hoje se apresente numa rotulagem mais sofisticada,sendo mais referida como "agronegócio"como resultado de sua enorme e rapida profissionalização se constituindo em empresas de grande portes e de "status", ainda assim, existe um grande desconforto por parte, especialmente, do proletariado rural de se pertencer a este meio, pois muitos sonham com uma ocupação em empresas de natureza urbana ou numa multinacional, que (imaginam) lhe trariam "mais valorização pessoal perante à sociedade", o que mostra que ainda o sonho de "se vencer" na vida está muito atrelado na ida para a grande metrópole em atividades que nada tenha a ver com a agricultura.
ENSEI NETO

PATROCÍNIO - MINAS GERAIS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 16/09/2010

Prezada Sylvia e Caro Bruno,

Simplesmente brilhante e sensível o artigo!

Como visto, o processo de indução da fuga do campo para a cidade, dentre os componentes apontados, tem como cerne o binômio Eficiência & Produtividade, ligados direta e inexoravelmente à Escala do Empreendimento.

Sentem-se estimulados a permanecer no campo aqueles que tem nas mãos um empreendimento moderno e própero. Isto se traduz em orgulho da atividade exercida. Sem dúvida, é esta a abstração que vocês identificaram.

Grande abraço

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