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Sobre ipês roxos, amarelos e uma caneca de café

POR ENSEI NETO

GIRO DE NOTÍCIAS

EM 21/07/2010

7 MIN DE LEITURA

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A observação da Natureza sempre nos leva a uma série de reflexões sobre a condição humana. Uma das mais interessantes é, sem dúvida, sobre a o movimento de translação da Terra que, combinado a um genial truque divino que é a inclinação do eixo Norte-Sul, faz com a partir de uma determinada faixa de latitude existam as chamadas Estações do Ano: Primavera, Verão, Outono e Inverno.

Estas estações ficam mais evidentes numa faixa intermediária, principalmente quando entre as linhas dos Trópicos e dos Círculos Polares, quando cada qual se expressa em plena forma: a explosão de cores e aromas da Primavera, o calor intenso do Verão, a troca de cores das folhas de algumas árvores que anunciam o Outono e o gélido e incolor Inverno. Como consequência, ficamos mais ativos no Verão, que, de forma deliberada, coincide com o período de férias, enquanto que no Inverno preferimos atividades mais intimistas.

Nos extremos, tudo muda. Por exemplo, nas regiões próximas à linha do Equador não se verificam grandes mudanças de estações ao longo do ano, muitas vezes se resumindo em apenas duas: uma chuvosa e outra seca. Praticamente não há variação de luz ao longo do ano, resultando em dias e noites com duração semelhante. Enquanto isso, próximo aos Pólos, se verifica uma concentração da luminosidade em parte do ano, enquanto que na outra, há o predomínio da escuridão. Ou seja, a Natureza trabalha na forma de ciclos, que acabam por reger todo o ciclo da vida no planeta.

É o que ocorre com o clima, talvez mais alterado hoje por conta do impacto que o Homem tem imposto por suas atividades de exploração das riquezas naturais ou mesmo pelas suas criações, como as cidades e as indústrias. Como contraponto, a Natureza tenta promover seus ajustes, porém os resultados podem levar a uma nova condição. Os ipês roxos estão em plena floração em julho, enquanto que os amarelos, que tradicionalmente soltavam generosos cachos dourados no início de setembro, nos últimos anos vem fazendo isso bem mais cedo.

A escolha dos processos de produção é decorrência do domínio técnico, da disponibilidade dos recursos e do conhecimento das características locais. É por isso que é quase sempre necessária uma adaptação de uma tecnologia ou serviço qualquer quando aplicados em novo local.

Das riquezas naturais, sem dúvida a mais preciosa é a Água. E aqui, duas particularidades sobre a água:

1) A quantidade de água no nosso planeta é exatamente a mesma desde o princípio dos tempos, alterando-se apenas sua forma ou combinação;
2) A água doce é parcela ínfima do total.

Por muitos e muitos anos, os países da América Central e Colômbia se utilizaram abundantemente da água para processar o seu café, pois como se localizam muito próximo à linha do Equador, é normal existir uma sucessão de floradas ao longo de cada safra, ciclos completos dispersos ao longo do ano. Para o cafeeiro, o clima nessas faixas geográficas sempre o estimulou a vegetar e produzir.

O processo por via úmida pode ser implantado com o objetivo de melhorar a seleção dos grãos na fase inicial do pós-colheita, que, naqueles países, vem das lavouras relativamente bem selecionados, pois em geral a colheita é feita seletivamente. De forma complementar, esses grãos descascados vinham repousando em tanques com água para se fazer a degomagem (= retirada da polpa ao redor do pergaminho) por processo enzimático.

Com a sucessiva pressão de ONGs e também dos diversos programas de certificação que se tornaram comuns ao mercado, o uso da água teve de ser repensado por esses países produtores, pois é um bem muito preciosos. Dessa forma, é bastante comum hoje, em boa parte daqueles países produtores, o uso de equipamentos fornecidos por empresas brasileiras, em sistemas semelhantes aos encontrados nos campos dos Cafés do Brasil, por serem bastante eficientes.

Mudaram eles ou mudamos nós?

Na realidade, o que se passa é que cada vez mais os cafeicultores brasileiros passaram a investir em suas linhas de produção, uma vez que com o aumento geral de custos e do nível geral de competição, a eficiência nos trabalhos se tornou a "pedra de toque". Não há dúvida da capacidade empresarial do cafeicultor brasileiro, que consegue domar rincões até então impensáveis para a cafeicultura como os arenosos solos do Oeste da Bahia cobertos por lavouras irrigadas, numa clara alusão de que a partir de uma situação aparentemente insólita, é possível obter excelentes resultados (ou, como se diz... "fazer uma limonada de um limão"!).



Dentro de uma visão global, nosso país, dentre os produtores de café, é um dos raríssimos que consegue combinar essa capacidade empresarial com o alto nível de tecnologia oferecido pelas instituições de pesquisa. Adicione-se a isso crescimento do mercado consumidor interno e estabilidade econômica, e o resultado é um futuro no mínimo promissor. Como todo sistema competitivo, é inevitável que alguns competidores fiquem pelo caminho, assim como grandes seleções consideradas favoritas tropeçaram recentemente numa fase inicial como as oitavas de final da Copa Mundial de Futebol na África do Sul. Nem sempre a tradição é garantia de sucesso ou sobrevivência, pois estes são resultados de exercícios diários e permanentes.

O advento do cereja descascado certamente foi um divisor de águas no mercado de café, pois ao permitir que a qualidade sensorial dos grãos em geral se nivelasse em todas as regiões, fez com que gradativamente os Cafés do Brasil ganhassem destaque pela sua qualidade e fornecimento estável por um número cada vez mais expressivo de produtores mais competitivos. Melhorias e aperfeiçoamentos nos processos de preparo de secagem, bem como no rebenefício, que passou a contar com equipamentos mais eficientes, refletem a busca da qualidade final dos grãos brasileiros para que estes mantenham o tão buscado fornecimento com estabilidade na quantidade e qualidade.

Todo este complexo é de vital importância porque o chamado Cinturão dos Cafés do Brasil se estende dos 12° aos 24° de Latitude Sul, quando o efeito das Estações do Ano se torna mais intenso. Graças a essa disposição geográfica, é esperado que nem toda florada terá um curso normal, ou seja, os frutos das floradas mais tardias geralmente não atingem a sua plena maturação, principalmente quando em lavouras de maior latitude. Esta é a razão porque a derriça é a forma de colheita mais adequada nas lavouras brasileiras de café, enquanto que as múltiplas floradas sempre serão um desastre...

A verdade é que o clima está se alterando de forma significativa, tendo-se observado aumento das temperaturas máximas e mínimas nos diversos continentes, ocasionando a propagação de pragas até então de impacto insignificante em países como a Colômbia ou mesmo o Kenya, cujos cafezais de altitude vêm sendo hoje atacados pela temida Broca. Novamente observa-se o binômio Ação e Reação devido às alterações climáticas!

Como parte dessas mudanças, as características sensoriais dos Cafés do Brasil vêm ganhando novos contornos, onde os chamados "sabores típicos" estão começando a perder sua tipicidade. Por exemplo, sempre se teve em mente que cafés do Sul de Minas são mais ácidos que, por exemplo, dos produzidos no Cerrado Mineiro. No entanto, algumas origens do Cerrado têm apresentado cafés com grau elevadíssimo de acidez, enquanto que algumas dos planaltos do Sul de Minas tem bebidas com sua quase ausência!

Mas não é de todo desastrosa essa mudança. Certamente, interessantes oportunidades se descortinam.



O aumento do ataque de pragas em países de baixa latitude, mesmo com lavouras em grandes altitudes, denota que o aumento da temperatura foi suficiente para que esses insetos possam atuar com maior desenvoltura. Porém, origens localizadas em maiores latitudes, mantém o mesmo perfil de fotoperíodo ao longo do ano (afinal, ao menos a inclinação do eixo da Terra ainda não sofreu mudanças!), o que explica em parte a produção de cafés com maior acidez no Brasil. E isto, sem dúvida, pode ser uma excepcional oportunidade de mercado.

E por que seria?

Aproximadamente 75% do consumo mundial de café ocorre no Hemisfério Norte, sendo que um pouco mais de 85% é consumido na forma de café preparado em coador ou similares, quando a concentração é pouco mais que a metade do tradicional Cafezinho brasileiro, que leva algo como 100 gramas de pó para cada litro de água. Nas baixas concentrações utilizadas na Europa, América do Norte e extremo Oriente (entenda-se Japão), o Sabor Básico mais perceptível é o Ácido (como o de um limão siciliano...), ao qual somos, em geral, cerca de 650 vezes mais sensíveis do que ao Sabor Doce, que é a marca registrada dos cafés produzidos em nosso país. Esta é a razão porque algumas origens tem seus grãos tão valorizados, como os da Colômbia e Kenya, pois esses cafés entram como reguladores de acidez nos blends das diversas indústrias.

O mercado de bebidas, como é o do café, é regido pela dinâmica da acomodação, ou seja, se um dado produto é descontinuado, rapidamente é reposto por outro.

Quem sabe, é o momento para um belo movimento estratégico dos Cafés do Brasil.

ENSEI NETO

Especialista em Cafés Especiais.
Consultor em Qualidade e Marketing, Planejamento Estratégico e Desenvolvimento de Produtos & Novos Mercados.
Juiz Certificado SCAA e Q Grader Licenciado.

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ENSEI NETO

PATROCÍNIO - MINAS GERAIS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 26/07/2010

Prezado José Adauto,

agradeço pelas considerações.
É muito importante que produtores e técnicos tenham percepção dessas mudanças e oportunidades que se criam. Aproveitar pode ser o caminho para o sucesso.

Grande abraço

Ensei Neto
JOSÉ ADAUTO DE ALMEIDA

MARUMBI - PARANÁ - PROVA/ESPECIALISTA EM QUALIDADE DE CAFÉ

EM 22/07/2010

Parabéns!
Ensei, seus artigos na coluna "Bebida & Blends" são sempre muito oportunos.
Sob o meu ponto de vista,acho que você está certo: O clima está mudando.
O café/a planta está alterando lentamente a sua fisiologia e se adaptando á situação climática onde está inserido. Tenho acompanhado algumas lavouras nos últimos anos no tocante á sabores da bebida (faço coleta de amostras da mesma variedade/lavoura, mesma adubação e tratos culturais, mesmo estágio de maturação de colheita, mesmos cuidados na secagem, etc.) e , tem apresento variações de ano para ano quanto a acidez, doçura e corpo. Cheguei a conclusão que cada safra tem um sabor característico, resultado da ação climática ocorrida durante a formação dos frutos.
Atenciosamente.

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