ESQUECI MINHA SENHA CONTINUAR COM O FACEBOOK SOU UM NOVO USUÁRIO
FAÇA SEU LOGIN E ACESSE CONTEÚDOS EXCLUSIVOS

Acesso a matérias, novidades por newsletter, interação com as notícias e muito mais.

ENTRAR SOU UM NOVO USUÁRIO
Buscar

Um colmatar das expectativas

POR CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

CELSO VEGRO

EM 06/10/2009

6 MIN DE LEITURA

2
0
A divulgação do "Relatório do Grupo de Trabalho Análise Estrutural da Cafeicultura Brasileira"1 foi o assunto do mês de setembro. Antes de qualquer apreciação crítica, deve-se enaltecer o esforço coletivo dedicado pela equipe na criação de inteligência para o agronegócio café, reconhecendo, antecipadamente, a plena legitimidade das tempestivas manifestações que se seguiram após a publicidade do estudo.

O fulcro das contrariedades se concentrou no consignado diagnóstico de inviabilidade econômica de parcela dos cafeicultores de arábica. Ao se contemplarem as entrelinhas do estudo e os posicionamentos contrários desencadeados, infere-se que as divergências se situam tanto na formas de apresentação das ideias como no seu conteúdo propriamente dito.

Os fenômenos sociais exigem em sua interpretação um olhar de processo, ou como preferem alguns sociólogos, de fluidez. A adoção de padrões rígidos conduz à geração de conclusões míopes no que diz respeito à capacidade de decifrar a realidade. Uma visão dinâmica, ao contrário, permite balizar o campo dos debates em que se movimentam as idéias.

A construção de uma tipologia econômica dos cafeicultores bastante simplificada resulta em três tipos fundamentais: a) cafeicultores situados na franja de exclusão; b) cafeicultores em fase de transição e c) cafeicultores plenamente consolidados2. Aparentemente, foi a inabilidade do grupo responsável pela produção do relatório em caracterizar adequadamente as premissas da tipologia adotada o estopim para o irrompimento das contrariedades.

Carecendo da construção de apropriada tipologia e com eivos estáticos no esforço analítico, o relatório se desenrola como se a eliminação de cafeicultores do segmento em que atuam fosse uma decorrência "natural" do deus mercado. Tal vício se transmite para o capítulo de formulação das políticas setoriais, pois as ações se concentram no apoio aos cafeicultores em transição e consolidados. Disso deduz-se que a eliminação daqueles situados na franja de exclusão dentro do arcabouço como sendo resultado de uma necessária "higienização" do segmento!

Ao não relacionar ações mitigadoras do impacto social da exclusão econômica, o relatório torna-se um documento de limitada aplicabilidade política. Os cafeicultores situados na franja de exclusão demandam ações públicas que propiciem sua reconversão produtiva, capazes de mantê-los dignamente enquanto produtores rurais, empregando inclusive conceitos como a multifuncionalidade da agricultura - preservação da paisagem e produção de água, por exemplo, que legitimem a concessão de vantagens econômicas e outros benefícios aos produtores nessa categoria enquadrados.

Após a divulgação dos resultados do Censo Agropecuário 2006 que ressaltou o incremento da concentração das terras no País, aquilo que menos se deseja é que na cafeicultura também se localizem fatores de fortalecimento dessa terrível tendência história do agro brasileiro.

O colapso econômico mundial de setembro de 2008 fez a todos relembrar que para os fenômenos sociais não existem certezas. Todavia, as análises do mercado de café têm valorizado, excessivamente, a posição dos estoques do produto enquanto elemento determinante na imutabilidade das cotações. Tal certeza é a próxima expectativa que será investigada visando construir cenário mais plausível para as cotações a médio prazo (quarto trimestre de 2009 e primeiro de 2010).

Perder de vista a sabedoria do decano dos economistas brasileiros, Eugênio Gudin, quando afirmou "café é câmbio", consiste no primeiro esquecimento imperdoável. A debilidade do dólar estadunidense que reflete as fragilidades daquela economia associada ao desbragado otimismo no que diz respeito ao porvir do brasileiro engendrará trajetória inapelável de valorização do real, fenômeno que já vem demonstrando seu pleno vigor nos últimos meses. Num deslocamento inversamente proporcional, a valorização do real incrementa as cotações em dólar do café e os movimentos se anulam. Independentemente da posição consolidada dos estoques, não se pode ser otimista com as cotações futuras para o produto mediante a flutuação cambial.

Outro condicionador do ambiente para a formação dos preços do café localiza-se nos processos especulativos atuantes no mercado do petróleo. Ainda que os estados nacionais busquem descarbonizar a matriz energética, o petróleo permanece sendo a "rainha" das commodities. Tal assertiva pode ser confirmada cotejando-se as curvas de preços de ambas as matérias primas em que se pode constatar a unidirecionalidade das oscilações (Figura 1).

Figura 1. Trajetória das cotações do petróleo (tipo Brent) e do café arábica (Nova Iorque em segunda posição), jan./07 a set./09


Fonte: IPEADATA e CaféPoint

A débil recuperação da economia mundial depende visceralmente da manutenção em patamar "aceitável" das cotações do petróleo. Nos Estados Unidos, por exemplo, para cada US$ 1,00 de incremento nas cotações do barril de petróleo, o país desembolsa US$ 4 bilhões a mais para atender sua demanda pelo produto. Tal exemplo se aplica a outras economias centrais como a Alemanha e outras nações da EU, o Japão e a Coréia e até mesmo a China.

Sob a vigência de cotações aceitáveis para o petróleo, tem-se nesse fenômeno outro modulador para a evolução futura das cotações do café. Em essência o que se enfatiza nessa abordagem é a condição de relatividade dos preços uns para com outros. Nenhum dos preços forma-se em absoluto, mas ao contrário, são mutuamente dependentes e inter-relacionados, especialmente, dentre aquelas matérias primas homogêneas.

Sem pretender esgotar o assunto traz-se a cena o quesito demanda agregada3. Uma monumental parte da riqueza foi fulminada pela crise econômica, empobrecendo acentuadamente as empresas e famílias, induzindo aos governos nacionais a desbaratarem montanhas de dinheiro de fato na atenuação dos possíveis impactos do colapso. Traduzindo o palavreado, os agentes econômicos se tornaram mais avarentos. Assim, crer que seja possível uma fácil aceitação por parte dos mercados de cotações em elevação para matérias primas básicas é uma hipótese quase patética. O café não possui nenhuma qualidade ímpar que faça desse produto uma exceção.

Há ainda um assunto que merece apreciação. Afinal, de que lado se deve posicionar na temática da rotulagem do café torrado e torrado e moído?

Os materialistas históricos possuíam um lema totalmente aplicado ao assunto: a união operário-camponesa, campo-cidade, na condução da revolução socialista. Embora a manifestação do diretor executivo da ABIC possa ter induzido na intensificação da polêmica que o tema contempla, as lideranças dos cafeicultores equivocam-se no alvo de sua mira. Os esforços estariam mais bem empregados caso estivessem municiando os órgãos de defesa do consumidor como os PROCONS, IDEC e Fundação Pró-teste. A solução para o falso dilema estabelecido - rotular ou não, somente encontrará desfecho aceitável mediante a aliança campo-cidade.

Se ainda restar dúvida quanto ao anacronismo da postura da indústria, basta pontuar a sinuca em que os torrefadores se auto-impuseram. Ao mobilizarem todos os lobbies de influência pró-norma de regulamentação da identidade do café torrado e do torrado e moído, sacramentando a lambujem de até 5% de umidade no produto, negam-se em prover de informação aquele que aparece como rei em seus materiais publicitários: "O CONSUMIDOR"! Arcaísmos; imperícia; relutância frente às novas exigências de transparência e confiança que crescentemente devem pautar as transações comerciais pós-crise econômica. Os torrefadores carecem, sim, de um novo estatuto que os resgatem desse viés oportunista.

"A suspeita é a tênia do espírito; não

perece enquanto lhe resta a cabeça".

Machado de Assis - Helena, cap.XX.



O autor agradece os comentários e sugestões efetuadas pela pesquisadora do IEA Marina Brasil Rocha.

1 Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento - Secretaria de Produção e Agroenergia. Agosto/2009. 23p.

2 A tipologia evidentemente se vincula ao perfil das políticas públicas exigidas para cada classe específica. Para os cafeicultores situados na franja de exclusão são necessários os denominados programas de reconversão produtiva. Para aqueles em processo de transição, mas ainda portadores de condições objetivas de se firmar na cafeicultura, as ações demandadas são aquelas capazes de introduzir avanços tecnológicos de cunho agronômico e outras inovações correlatas; que aprimorem os mecanismos utilizados na comercialização e promovam saltos na qualidade do produto. Por fim, para os cafeicultores consolidados a exigência é mais localizada e que incrementem a competitividade já alcançada como, por exemplo, a facilitação do seguro; o apoio na contratação de hedge e de fortalecimento das empresas coletivas de apoio à produção, comercialização e agregação de valor.

3 Definida como somatório do consumo privado, investimento, despesas governamentais e saldo comercial menos a diferença entre exportações e importações.

CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

Eng. Agr., MS Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade. Pesquisador Científico VI do IEA-APTA/SAA-SP

2

DEIXE SUA OPINIÃO SOBRE ESSE ARTIGO! SEGUIR COMENTÁRIOS

5000 caracteres restantes
ANEXAR IMAGEM
ANEXAR IMAGEM

Selecione a imagem

INSERIR VÍDEO
INSERIR VÍDEO

Copie o endereço (URL) do vídeo, direto da barra de endereços de seu navegador, e cole-a abaixo:

Todos os comentários são moderados pela equipe CaféPoint, e as opiniões aqui expressas são de responsabilidade exclusiva dos leitores. Contamos com sua colaboração. Obrigado.

SEU COMENTÁRIO FOI ENVIADO COM SUCESSO!

Você pode fazer mais comentários se desejar. Eles serão publicados após a analise da nossa equipe.

CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

SÃO PAULO - SÃO PAULO - PESQUISA/ENSINO

EM 16/10/2009

Prezado Samuel Henrique Fornari,

Estava a estranhar sua ausência em nossas trocas de ideias. Ainda bem que resolveu reaparecer. Parece que esse último artigo caiu em suas graças.

Todo aquele que vive do que faz tende a expressar um cenário positivo para aquilo em que atua. Esse é seu legítimo viés. Quanto a mim, fico com a parte final de sua carta: esperar para ver.

Saudações cafeeiras. E por favor, compareça com suas opiniões assim como eu marco ponto com minhas confusões.
SAMUEL HENRIQUE FORNARI

SÃO JOSÉ DO RIO PARDO - SÃO PAULO - DISTRIBUIÇÃO DE ALIMENTOS (CARNES, LÁCTEOS, CAFÉ)

EM 16/10/2009

Primeiramente, parabéns pelo artigo!

É amigo, o cenário que tracei lá no "Goles de Pessimismo" vem acontecendo. Euro valorizando, juros baixos nos EUA e corrida por commodities assim que o mundo voltasse a girar ao menos um pouco.

Penso somente um pouco diferente em relação a algumas coisas. Penso que em breve as altas que virão poderão ser repassadas de forma mais consistente aos produtores, em virtude de um esgotamento, ou quase esgotamento da queda do dólar.

Outra coisa é o consumo, sobre o qual também alertei meses atras - aqueles números da Nielsen não me convenceram até hoje. Vejo o maior produtor do mundo batendo recorde de exportação por uma série de motivos (safra grande de 2008, vendas de estoques remanescentes pra fazer dinheiro em virtude da crise), mas não consigo encontrar a contrapartida dessas exportações nos estoques internacionais. Ontem foi divulgado queda de 200 mil sacas nos estoques americanos, estoques europeus tiveram leve variação positiva em se tratando de arábica, ai eu me pergunto, onde foi parar essa exportação recorde do Brasil?

Penso que teremos um nível de preço mais alto em algum ponto daqui até maio do ano que vem, pois como sabemos, safra menor e sérios problemas de qualidade afetarão a oferta, principalmente café de qualidade.

Alguns podem perguntar, mas e o safrão de 2010? Esse ai pelo que andei vendo pelo Sul de Minas (lavouras com pés novos de pequeno porte, um espetáculo de florada. Já as antigas e grandes... (não sei não), e pelo que a Cooxupé já andou anunciando, também em sua área de atuação, parece não ser mais o gigante antes profetizado.

Neste sentido, penso que a safra maior de 2010 servirá apenas de alívio no futuro para o aperto de oferta que encontraremos no segundo semestre. É esperar pra ver!

Saudações

Assine nossa newsletter

E fique por dentro de todas as novidades do CaféPoint diretamente no seu e-mail

Obrigado! agora só falta confirmar seu e-mail.
Você receberá uma mensagem no e-mail indicado, com as instruções a serem seguidas.

Você já está logado com o e-mail informado.
Caso deseje alterar as opções de recebimento das newsletter, acesse o seu painel de controle.

CaféPoint Logo MilkPoint Ventures