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Infame indução

POR CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

CELSO VEGRO

EM 04/06/2014

5 MIN DE LEITURA

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A partir da última década do século passado e com mais ímpeto ao início desse novo milênio, crescentes preocupações com aspectos vinculados à sustentabilidade (sócio-econômica e ambiental) intrínsecos à dinâmica dos negócios têm sido introduzidas às estratégias empresariais. Em realidade, esse despertar para o tema decorre fundamentalmente dos feedbacks originados nas pesquisas junto aos clientes finais, associados à pressão da sociedade civil cada vez mais esclarecida e exigente, no sentido de que sejam buscadas maneiras mais equilibradas/justas de produzir e vender1.

Ademais, problemas sanitários com alimentos trouxeram grande apreensão às autoridades públicas, pois havia riscos latentes de irrupção de processos epidêmicos. Os casos da vaca louca; contaminação por dioxina e, mais recentemente, dos estafilococos em produtos orgânicos, causaram pânico junto aos consumidores2, distribuidores e processadores, acarretando a incomensuráveis perdas econômicas aos agentes envolvidos.

Desse modo a rastreabilidade e a certificação dos processos produtivos, passaram a se constituir em exigências imprescindíveis aos componentes das distintas cadeias agroalimentares. Líderes empresariais pronunciaram-se publicamente3, estabelecendo prazos para que em todo seu processamento e/ou sua produção fossem empregados exclusivamente matérias-primas com certificação atestada. A cadeia do café não se configurou em exceção ao fenômeno.

Diante desse discurso os gestores das explorações cafeeiras foram fortemente estimulados a prepararem-se para a certificação. Empresas imbuídas desse escopo estruturaram-se, passando a oferecer serviços de certificação/verificação dos sistemas produtivos e de acreditação dos produtos finais ofertados. A demanda pelo serviço foi de tal magnitude que não causaria espanto reconhecer nesse ramo de negócios um dos mais promissores na atualidade.

A adesão de cafeicultores a qualquer dos distintos protocolos das certificadoras promoveu, indiretamente, reconhecida melhoria na gestão técnica-agronômica, social e ambiental das explorações. O choque de racionalidade a que se submeteram os gestores, dessas unidades produtivas, trouxe ganhos competitivos que não se cogitam mais ser abandonados, mas ao contrário, novas e melhores práticas de sustentabilidade e competitividade estão permanentemente sendo buscadas e selecionadas dentro da adequação aos processos produtivos praticados.

Os compradores desses cafés certificados, em geral, mais próximos de seus fornecedores (encurtando, portanto, a tradicional cadeia de intermediação comercial), puderam oferecer ágios pelo produto sem onerar sua planilha de custos, gerando maior interesse daqueles cafeicultores não aderentes à sistemática. Ademais, as empresas promoveram, ainda, oferta de assistência técnica e de financiamento para que as propriedades se adequassem as exigências do respectivo protocolo. Associados os fenômenos, o movimento por certificação espraiou-se sob a forma de boom pelos principais cinturões cafeeiros. Gestores de cooperativas brasileiras, após análise dos protocolos de cada empresa (tanto de certificação quanto de verificação), selecionaram aquela que permitiria elevar à condição de cafeicultores certificados todo seu quadro social, catapultando a quantidade de produto selado.

Enfim, o resultado global da expansão da oferta de cafés certificados no mundo foi explosivo. Em 2013, levantamento efetuado por importante trader brasileiro do segmento, contabilizou mais de 40 milhões de sacas de café verificado apenas para o 4C. Surpreendentemente, a oferta excedeu a demanda inclusive para a certificação fair trade!, o que foi regra para os demais certificados, ou seja, maior oferta que sua respectiva demanda (Figura 1).


Figura 1 – Oferta e Demanda Mundial por Cafés Sustentáveis, 2013
Fonte: 20o Seminário Internacional de Café em Santos, 2014.

Os cafeicultores e suas cooperativas (caso brasileiro) ao aderirem aos protocolos das certificadoras almejam, após a conclusão dos processos de ajustes e obtenção do selo, realizar o valor adicional que esse produto passa a representar por possuir diferenciação real frente ao congênere commodity. Todavia, sem capacidade em absorver, com ágio, toda a oferta existente para produto certificado/verificado, as torrefadoras transnacionais compradoras desses cafés, acabam recebendo-os como produto commodity (sempre há e haverá mercado líquido para café certificado ou não), obtendo vantagens nessa transação (confiabilidade, rastreabilidade, qualidade, sanidade, etc..) e, eventualmente, ganhos econômicos derivados de benefícios na linha de processamento derivados da padronização dos grãos e perfil da bebida.

O poder de mercado dessas empresas transnacionais é amplamente reconhecido. Movimentos altistas nos preços de suas matérias-primas são imediatamente repassados aos preços de atacado e/ou varejo consumidor. Esse mesmo poder poderia ser empregado na criação da demanda capaz de absorver com mais celeridade a oferta certificada/verificada. Investimentos em P&D, marketing e iniciativas promocionais possuem a capacidade de transformar a demanda apenas potencial em efetiva4.

Se a certificação fosse de fato um compromisso de cadeia e não uma exigência imposta aos cafeicultores, as torrefadoras compradoras deveriam receber esse café e mantê-lo em estoque até que a demanda fosse criada em esforço de antecipar o calendário de substituição da commodity anteriormente anunciado. Ao fazer isso não haveria prejuízo econômico, pois, estocar café verde é estratégia de hedge de preços que se torna mais interessante ainda, em momento do ciclo econômico da cultura marcado por volatilidade próxima dos 50%. Essa postura demonstraria o efetivo compromisso com a sustentabilidade e concederia a oportunidade dos cafeicultores certificados realizarem o valor de seu investimento e esforço.
Mantida a demanda aquém da oferta existente, depreende-se que a estratégia comercial prevalecente é do mero esverdeamento da linha de produtos, sem compromissos viscerais com a introdução de graus mais elevados sustentabilidade na linha de produtos.
Certificar a produção pode ser a partir dessa análise entendida como um “mal necessário”. Dificuldades a transpor, custos a incorporar, contratos a assinar exclusivamente pela expectativa de baixa probabilidade em valor realizar. Sem dúvida que haverá aqueles que conseguirão colocar 100% de seu café certificado junto à traders e torrefadoras que possuem linhas de produto sustentável, mas a cafeicultura brasileira e do resto do mundo já certificado/verificado terá que se contentar com os benefícios microeconômicos derivados da gestão mais aprimorada. Todavia, que não se tire a razão daqueles que se mantiverem distantes dos protocolos apregoados, pois o equilíbrio dessa balança, definitivamente, não pende para seu lado.


1Relatório assinado pelo CEO da UNILEVER, desenhando tendências para 2020, apontou para um esgotamento da estratégia, até então prevalecente, de crescimento pautado pelo incremento das vendas.
2 Postura totalmente justificável na medida em que foram contabilizadas dezenas de mortes em decorrência do consumo desses alimentos contaminados.

3 Lista resumida dos compromissos públicos para até 2015 das principais transnacionais do agronegócio café com inteções de introduzir material-prima certificada em seus produtos.
Kraft - 100% do volume Europa 4C/RA;
Nestlé:
The Nescafé Plan RA – 1,5 milhões de sacas;
The Nescafé Plan 4C – 3,0 milhões de sacas;
Nespresso AAA - 80% até 2013. – 800 mil sacas;
Sara Lee - 20% do volume mundial UTZ;
Starbucks - 100% C.A.F.E. Practices; e
Tchibo - 100% certificado RA/UTZ.

4 O fenômeno de vendas das cápsulas é ilustrativo desse princípio.

CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

Eng. Agr., MS Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade. Pesquisador Científico VI do IEA-APTA/SAA-SP

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CELSO LUIS RODRIGUES VEGRO

SÃO PAULO - SÃO PAULO - PESQUISA/ENSINO

EM 06/06/2014

Prezado PH

Bons ventos o trazem.

Seu comentário consegue ser mais assertivo que em toda minha análise.

Grato pelo prestígio que concede a este escriba.

Abçs

Celso Vegro
PAULO HENRIQUE LEME

LAVRAS - MINAS GERAIS - PESQUISA/ENSINO

EM 05/06/2014

Caríssimo Celso,



Um texto certeiro, como sempre. A lógica de mercado de produtos certificados ainda é a de repetir as práticas utilizadas no sistema de commodities. O sonho das grandes empresas do mercado é o de possuir um fornecimento garantido acima de sua demanda. De modo algum aceitarão a possibilidade de se tornarem reféns da produção.



O caso é que no ímpeto de atender as demandas dos consumidores, relatada em diversas pesquisas de opinião que devem ter realizado, prometeram metas inviáveis para o prazo estipulado. Agora repassam esta responsabilidade para a produção, Quem pagará a conta? São os cafeicultores, é claro.



Se realmente desejassem uma cafeicultura mais sustentável, pagariam prêmios de preço para cafés realmente CERTIFICADOS. Prêmios que incentivariam a mudança de paradigma da gestão cafeeira que tanto necessitamos. EM TODO O MUNDO. E como bem citado em seu artigo, teriam comprado o café certificado (ou verificado) em excesso no mercado.



A dose de compra é, porém, homeopática e oportunista.



Do outro lado, para os cafeicultores as certificações são a possibilidade de mudarem seu paradigma de gestão. Uma decisão de sobrevivência, independente dos cenários futuros. Devem se "desapegar" de vultuosos prêmios de preço, mas de qualquer forma, segundo relatos do CECAFÉ, o ágio de preço ainda ocorre de forma constante.



De certo, é uma infame indução.



Um abraço,



PH
WAGNER

SANTA RITA DO SAPUCAÍ - MINAS GERAIS - PRODUÇÃO DE CAFÉ

EM 05/06/2014

Caros amigos

como dizia meu avo,tataraneto de cafeicultores

"Quando falta cafe,ate bosta de cabrito serve,

Quando tem muita oferta ,pode pintar de ouro que ninguem quer

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